12 de dez. de 2011

Entrevista: Eric Hobsbawm

Reproduzo entrevista dada pelo historiador Eric Hobsbawn publicada no site http://www.socialismo.org.br








Eric HobsbawmO historiador Eric Hobsbawm - que tem sua trilogia (A Era das Revoluções, A Era do Capital e A Era dos Extremos) reeditada no Brasil - diz que o aniversário da queda do Muro de Berlim deveria motivar uma discussão sobre o Ocidente pós-guerra fria. Defendendo suas convicções marxistas, ele afirmou: "Me recuso a dizer que perdi a esperança". Para Hobsbawn, o capitalismo chegou ao seu limite.

Quando Eric Hobsbawm estava escrevendo "A Era do Capital" -lançado em 1975-, explicou que fazia um imenso esforço para estudar algo que não lhe agradava nem um pouco. Hoje, o historiador marxista diz ter o mesmo sentimento, "eu não gostava da burguesia vitoriana e ainda não gosto, embora apreciasse o dinamismo daquele tempo". À essa impressão, porém, vem adicionando, nos últimos anos, mais uma, a nostalgia.

"Agora, quando comparo o século 19 com o 20, sinto simpatia pelo modo como aqueles homens acreditavam no progresso. Foi um século de esperança. E essa minha nostalgia cresce à medida que o tempo passa e vejo, com pessimismo, o que vem acontecendo", diz.

Hobsbawm, 92, conversou com a Folha por telefone, de Londres, justamente sobre a reedição no Brasil de sua trilogia sobre o século 19 ("A Era das Revoluções", "A Era do Capital", "A Era dos Impérios"), já um clássico da historiografia sobre o período, pela editora Paz e Terra -que também relançará em 2010 outro título do historiador, "Bandidos".

Na trilogia, Hobsbawm analisou o que chamou de "longo século 19", período que vai de 1789 a 1914. Começa com as revoluções europeias que definiram a expansão do capitalismo e do liberalismo no planeta -a Francesa e a Industrial inglesa- e vai até as vésperas da Primeira Guerra Mundial.

Apesar dos ataques que sofre por ainda defender a bandeira do comunismo, os três volumes de Hobsbawm são reimpressos todos os anos na Inglaterra, tendo sua explicação sobre o tema se imposto como uma espécie de cânone.

Hobsbawm é com frequência procurado para comentar temas do presente -algo que seus críticos tampouco perdoam. Agora, às vésperas do aniversário de 20 anos da queda do Muro de Berlim (em novembro), seu conhecimento sobre os tempos que estudou e vivenciou, assim como suas convicções políticas, são novamente trazidos ao debate.

"A queda do Muro foi o fim de uma era. Não só para a Europa do Leste, mas para o mundo inteiro. O capitalismo chegou a seu limite e a a crise econômica mundial indica claramente o fim de um ciclo."

Contudo, o historiador considera que as discussões sobre o episódio estão muito centradas em tentar entender por que a experiência comunista fracassou, quando o que deveria estar na pauta é o futuro do Ocidente. Para ele, o mundo pós-Guerra Fria ainda não fez uma necessária autocrítica.

Leia trechos da entrevista que Eric Hobsbawm concedeu à Folha:

O que mais deveria ser discutido no aniversário de 20 anos da queda do Muro de Berlim?
A celebração é oportuna porque o capitalismo agora chegou a seu limite. A crise econômica mundial é o fim de um ciclo, que começou a ruir quando caiu o Muro em Berlim. No Leste Europeu, vejo dificuldade em rompimento com o legado comunista. Mas é o Ocidente quem deve refletir mais sobre o que ocorreu na Guerra Fria e o que pode ser feito para evitar um novo colapso.

As "Eras" são consideradas um exemplo de boa análise histórica dedicada a um amplo período. O sr. acha que falta ambição a historiadores hoje?
Para fazer história com uma perspectiva maior, é preciso ser um intelectual maduro. Hoje, os jovens historiadores gastam muito mais tempo em suas especializações. Quando estão aptos a dar um passo maior, hesitam. A história equivocadamente se afastou da "história total" que fazia Fernand Braudel [1902-1985]. 

O sr. começa "A Era dos Impérios" contando uma história autobiográfica (a do encontro de seus pais no Egito) e então propõe uma reflexão sobre história e memória. Quão diferente foi escrever este volume, que se refere a passagens mais próximas do seu olhar no tempo, do que os anteriores?
Neste livro tive de trabalhar com o que chamo de "zona de penumbra", onde se misturam nossas lembranças e tradições familiares com o que aprendemos depois sobre determinado período. Não é fácil, pois trata-se de um território de incertezas e em que há um elemento afetivo. Por outro lado, trata-se de uma oportunidade de estimular aquele que lê a pensar sobre como seu próprio passado está relacionado com a história.

Em seu novo livro ("Reappraisals"), o historiador britânico Tony Judt escreveu um ensaio sobre o senhor ("Eric Hobsbawm and the Romance of Communism"). Neste, mostra admiração por seu conhecimento, mas faz uma severa crítica: "para fazer o bem no novo século, nós devemos começar dizendo a verdade sobre o antigo. Hobsbawm se recusa a mirar o demônio na cara e chamá-lo pelo nome". Como o sr. responderia a seu colega?
A crítica de Judt não se justifica. O que ele quer é que eu diga que estava errado. Em "A Era dos Extremos", eu encaro o problema, o critico e condeno. Não tenho problemas em dizer que a Revolução Russa causou dor e sofrimento à população russa. Porém, o esforço revolucionário foi algo heroico. Uma tentativa de melhorar a sociedade como não se viu mais na história. Me recuso a dizer que perdi a esperança.

O sr. havia dito, numa entrevista ao "Independent", que havia alguns clubes dos quais não iria ser sócio nunca, referindo-se aos intelectuais ex-comunistas. Ainda pensa assim?
Não vejo problema quando um intelectual, especialmente de países do Leste Europeu, percebe que a democracia é melhor do que o sistema autoritário em que vivia. É normal a mudança de posição quando surgem fatos novos. O ex-comunista que condeno é aquele que antes militava em grupos de esquerda e que hoje tem uma bandeira única, a de ser anticomunista apenas, esquecendo-se do resto das ideias pelas quais lutava. Também me entristece ver intelectuais jovens, que não passaram pela história dessas lutas, repetindo e tentando tirar benefício desse mesmo tipo de propaganda.

A América Latina está às vésperas de comemorar, em vários países, os 200 anos do início das lutas de independência. Que análise faz do atual momento?
A dependência econômica ainda é um fato, mas politicamente a América Latina é cada vez mais livre. Washington jamais voltará a exercer a influência de antes, tampouco a apoiar golpes ou ditaduras como fez no passado. O que está acontecendo em Honduras é um sinal disso. O Brasil tem papel central nesse processo, uma vez que o México se transforma cada vez mais em apêndice dos EUA.

Eric Hobsbawm






26 de out. de 2011

Geografia em quadrinhos

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Não só com textos se ensina Geografia...

Clássicos: O ESTUDO GEOGRÁFICO DAS CIDADES


O ESTUDO GEOGRÁFICO DAS CIDADES*
Pierre Monbeig

Numa resposta a um inquérito do Conselho Nacional de Geografia, Gilberto Freire sublinhou a raridade e o interesse dos estudos de geografia urbana no Brasil[1]. Tal raridade é surpreendente num país onde o desenvolvimento de algumas, grandes metrópoles e a vida mais modesta, porém ativa, de centros urbanos intimamente ligados ao meio rural, deveriam normal mente atrair as pesquisas: um artigo de ordem geral de Deffontaines, seu esboço sobre o Rio de Janeiro, as publicações de Preston James, as de Otto Quelle (de acesso difícil), uma monografia sobre Petrópolis do professor Arbos, eis, ao que me parece, as únicas verdadeiras tentativas de monografias de geografia urbana brasileira. Naturalmente, convém assinalar os estudos de caráter sociológico ou mais puramente urbanísticos, como os do Departamento de Cultura que a, Revista do Arquivo publicou, ou o volumoso livro de Agache sobre o Rio, ou ainda o artigo de Caio Prado Júnior na revista Geografia, não sendo estes, porém, verdadeiras e completas monografias geográficas. Mais curioso ainda é que este tema estava na ordem do dia do Congresso de Geografia de Florianópolis e que, com exceção da colaboração paulista, não reteve senão medianamente a atenção dos estudiosos brasileiros.
Entretanto, na maioria dos países onde a geografia moderna está bem desenvolvida, a geografia urbana tem visto aumentar a sua bibliografia, não só com artigos de revistas, mas também com obras de maiores dimensões, na Alemanha, nos Estados Unidos e na França[2].
O estudo geográfico de um organismo urbano é um dos mais típicos das concepções e dos métodos da geografia, segundo as diretrizes que lhe traçaram Ratzel, Vidal de Ia Blache, Brunhes e mais tarde os geógrafos americanos; a cidade, nascida num quadro geográfico definido, torna-se logo um organismo artificial, pelo menos aparentemente, e suas relações com o meio natural manifestam-se de modo mais sutil do que as de um povoamento rural. O conjunto das construções urbanas é suficiente para dissimular a topografia e quantos paulistas passam pelo Anhangabaú lembrando-se que ali corria outrora um riacho? O geógrafo vê-se então, mais que em qualquer outro terreno familiar às suas pesquisas, levado a trabalhar com auxílio dos historiadores, dos sociólogos e dos economistas e, mais ainda, a consultar os técnicos em cidades que são os urbanistas. Assim, o caráter eminentemente sintético da geografia humana se acha acentuado nos inquéritos de geografia urbana. Queen e Thomas, particularmente, apreenderam bem isso e mostraram pelo exemplo de sua  colaboração (o primeiro c sociólogo e o segundo, geógrafo) como o estudo das grandes cidades só pode ser feito pela modificação constante dos pontos de vista e das técnicas próprias das diversas ciências das sociedades humanas[3]. Tudo isto prova que há aí um campo de trabalho interessante, não só em si mesmo, como também pelos contactos científicos que determina.
Esta interpenetração das disciplinas, que apenas reflete a dos fatos, não acarreta uma dissolução de cada uma delas e, embora a ciência geográfica recorra largamente às suas irmãs, conserva seu ponto de vista e seu método.
Somos, então, levados a inquirir o que estuda o geógrafo que se inclina sobre uma cidade. Para ele, a cidade é uma forma de ato de posse do solo por um grupo humano; qual é este solo, quais são estes homens, eis as primeiras indagações a serem feitas. Mas, com exceção das cidades-cogumelos que nascem e crescem em alguns anos nas zonas pioneiras, encontramo-nos diante de organismos já formados, e como a situação presente é apenas um momento numa longa série evolutiva, e não poderia ser interpretada convenientemente sem a reconstrução desta série, convém também transpor nossas Indagações ao passado. Qual é este solo que a obra do homem tem freqüentemente modificado e quais foram estes homens? O ponto de vista que domina o estudo geográfico de uma cidade, assim como todo o estudo da geografia humana, é o das relações de uma sociedade humana com o changing environment. Não é, absolutamente, com efeito, apenas o jogo do acaso que fez com que exatamente em um certo ponto do solo, nascesse e se desenvolvesse um aglomerado urbano; e o organismo urbano, na sua forma e na sua função, só pôde desenvolver-se aproveitando certos elementos naturais (digamos assim para usar a terminologia corrente); ou, ao contrário, foi preciso superar obstáculos opostos pela natureza, mas que a técnica, posta em ação e de algum modo estimulada pelas necessidades econômicas, finalmente reduziu. As monografias urbanas já realizadas tem demonstrado que, neste campo como em tantos outros, não havia imperialismo do meio natural e que, por exemplo, Grenoble tornou-se a capital dos Alpes Franceses a despeito das perpétuas ameaças de destruição que lhe impõem os ribeirões alpinos que aí confluem; mas, demonstraram também que as cidades ditas artificiais, como Madri, têm uma infra-estrutura geográfica cujas conseqüências seria errado desprezar. Se, de um lado, foi um dos mestres da geografia moderna, Vidal de Ia Blache quem assinalou o papel da vontade humana no crescimento das cidades, quando disse: "a natureza prepara o local e o homem organiza-o de modo a corresponder a seu desejos e necessidades”, de outro lado foi um historiador, que era sobretudo um arqueólogo, Camille Julian, quem demonstrou a necessidade de distinguir o "elemento de formação” e o "elemento de progressão". Um outro historiador, que se tornou urbanista, Lavedan, inverteu a fórmula do geógrafo (trinta anos depois), afirmando que “o homem escolhe, depois utiliza o local preparado pela natureza”[4]. Assim é acentuado cada vez mais o papel do homem e da sua vontade (ou do seu capricho), sem que jamais seja esquecida esta verdade de La Falisse: o homem trabalha com o concreto; a cidade nascida da vontade humana é construída é desenvolvida num quadro natural , e devem ser levados em conta igualmente os dois parceiros deste match eterno. Será preciso estudar, então, não somente os elementos do quadro natural, mas também a massa humana, seu volume, sua composição, sua localização no passado e no presente.
As variações de volume e de distribuição da população correspondem a impulsos de crescimento e épocas de estagnação da cidade sobre o terreno; tais variações tem acarretado modificações do cenário urbano, uma vez que transformações da arquitetura puderam eventualmente; acompanhá-las. Como é marcada esta evolução sobre o solo? Em que proporção foi ajudada ou dificultada por elementos naturais? Não representam as casas urbanas uma utilização dos recursos oferecidos aos homens pelo meio geográfico? Não concretizam estas casas modificações que se produziram no correr dos anos na função da cidade? Cabe ao geógrafo esta análise do cenário urbano, assim como a do cenário rural. Análise que não poderia ser árida, a fim de parecer mais "científica", pois deve exprimir a alma da cidade. O agrupamento urbano com suas fábricas, seus escritórios, suas estações, seus homens e seus capitais, desempenha um papel original, que já não é hoje, sem dúvida, o que foi ontem: esta função urbana também depende, ao mesmo tempo, do que os homens encontraram na natureza e do que tiveram necessidade de realizar; é exercida num certo raio em torno da cidade, com facilidade e intensidade maiores ou menores, segundo o relevo e as distâncias, Ainda aí' o problema é essencialmente geográfico, pois refere-se à posse do solo. Graças a esses elementos de documentação, poder-se-á medir a influência da cidade sobre os meios rurais, sobre outros agrupamentos urbanos menores, ou sua dependência em face de concentrações mais poderosas. A geografia urbana não se limita ao estudo das grandes capitais: cidades pequenas apresentam tanto interesse quanto as colméias urbanas modernas e é quase sempre mais difícil precisar seu mecanismo e o ritmo calmo de sua vida, do que analisar as engrenagens bem lubrificadas, correndo a toda velocidade, das metrópoles imponentes. Na Europa, a pequena cidade de passado imemorial é ainda muitas vezes responsável por fenômenos políticos e econômicos; o Brasil, que (esquecemos disso com muita facilidade) é um país novo, mas velho de quase meio milênio, tem suas cidades pequenas estreitamente ligadas à vida rural; e isto não somente nas regiões do Brasil colonial, mas também nas zonas de povoamento recente; elas também merecem algumas monografias.
Nestas considerações gerais não é sem dúvida supérfluo lembrar que todo trabalho geográfico supõe o estabelecimento de mapas; a representação cartográfica continua a ser o melhor meio de esquematizar e dar da realidade uma representação a um tempo exata e eloqüente. Vulgarizado pelas diversas escolas geográficas modernas, o emprego do mapa foi adotado pela sociologia e pela etnografia, sobretudo americana, c os estudos clássicos da escola de Chicago mostram tudo o que é possível conseguir desse emprego, exatamente em matéria de inquéritos urbanos[5].
Sob todos os seus aspectos, a monografia geográfica de uma cidade permanece fiel ao método geográfico e ao seu princípio, que é o estudo das relações das sociedades humanas com o meio natural no passado e no presente. Mas, está claro que não se deve trabalhar com pontos de vista exclusivos e que a estreita ortodoxia geográfica seria o inverso mesmo da realidade. A demarcação entre os fatos geográficos, sociológicos ou econômicos raramente é fácil, principalmente quando o objeto da pesquisa é um aglomerado urbano; nestas condições, será absurdo pretender exigir que o pesquisador se detenha diante de fronteiras teóricas e universitárias. O que pode limitar o campo de estudo parece-me provir, principalmente, das diferenças de métodos aplicados ao estudo de fenômenos diferentes: o geógrafo levantará os mapas da distribuição das densidades das raças ou das profissões, no interior da cidade, e procurará explicá-los; tais mapas serão indispensáveis ao sociólogo que os completará por outros que representarão fenômenos puramente sociais: mapas dos suicídios, da freqüência escolar, das religiões. Estes, por sua vez, poderão e deverão mesmo ser utilizados pelo geógrafo desejoso de descrever bem a cidade, mas tais fenômenos necessitam, para serem explicados, de métodos de pesquisa e de hábitos de pensamento que o geógrafo não possui. Assim, as técnicas científicas constituem uma barreira automática, exceto para os presunçosos, que não hesitarão em transpô-la.

A posição das cidades

O ponto de partida de toda pesquisa de geografia urbana é, pois, o estudo do quadro natural em que nasceu e cresceu a cidade. Deve-se, em suma, fazer tabula rasa de tudo o que os homens puderam acrescentar ao cenário natural por meio de suas casas, estradas, etc., e restabelecer, no sentido em que os arqueólogos e os epigrafistas empregam este termo, a paisagem natural tal como era no tempo em que o núcleo urbano começou a se desenvolver. É antes de tudo sobre o mapa topográfico que é preciso trabalhar: ele traz à luz as linhas diretrizes do relevo, suas formas, seus contrastes, e, comparado com o mapa geológico, revela já o essencial dó problema. Porem, o relevo não é tudo: o revestimento vegetal também deve ser considerado ao mesmo tempo que o clima. Entre os diversos fatores naturais, o elemento relevo aparece como o mais decisivo, e sobretudo como o mais fácil de sã patentear na primeira análise. Mas, correríamos o risco de ser singularmente incompletos, negligenciando outros agentes geográficos como o clima, por exemplo, não somente na sua ação direta, mas na medida em que se combina com as condições topográficas. Um exemplo excelente é fornecido pelo caso do Rio de Janeiro: as fortes chuvas estivais que tomam às vezes proporções catastróficas, têm a sua influencia reforçada pelo abrupto dos morros dos quais as águas descem brutalmente, enquanto nas planícies, com altitude pouco superior a zero sobre o nível do mar, elas se estendem em lagunas, pântanos, que constituem outras tantas dificuldades a vencer. Não só as construções urbanas encontravam aí um obstáculo, mas a saúde pública sofreu com isso até o primeiro quartel do século. O desenvolvimento de Santos acompanhou o do café e o das vias férreas paulistas, mas, do ponto de vista urbano, foi também conseqüência da planície baixa sob um clima quente e úmido. Todos os elementos do meio geográfico devem ser submetidos a um exame minucioso e crítico; pois se nos contentarmos com enumerar os caracteres topográficos, vegetais e climáticos, nada faremos de útil. Estes caracteres não são interessantes em si mesmos, mas sim na medida em que contribuíram, sob uma forma qualquer, para a formação e o crescimento da cidade; e seu exame só deve ser empreendido para levar ao estabelecimento de relações (positivas ou negativas) entre eles e a formação urbana. Nesse domínio, como nos outros, a geografia não consiste em colocar lado a lado um elemento do relevo, um fenômeno climático, um dado geológico, um aspecto da vegetação e um trecho da história; ela procura compreender de que modo fenômenos isoláveis foram estreitamente ligados uns aos outros pelo jogo de ações e interações.
O estudo do quadro natural deve ser levado a efeito a partir de dois aspectos, simultaneamente: estudo da situação e estudo do local urbano. 
Por situação da cidade entendo a posição geral da cidade em relação a um vasto conjunto regional, sobretudo topográfico, mas não exclusivamente. O estudo da situação de uma cidade consiste em considerar esta cidade no conjunto regional de que faz parte, podendo este conjunto ter uma verdadeira unidade natural, ou, ao contrário, resultar do contraste entre regiões naturalmente opostas. Alguns exemplos poderão precisar esta noção. Na revista Urbanisme[6], um geógrafo francês, Dion, tentou explicar as origens geográficas das numerosas cidades que há séculos prosperam nos terrenos baixos e úmidos da Flandres belga e francesa, Lille, Saint-Omer, Yprès, Gand e Bruges que viveram, morreram e conheceram desde 1919 certo renascimento; estas cidades, que viram nascer as instituições municipais medievais e que marcam, pela sua população densa, uma oposição violenta entre a região baixa e superpovoada e a região alta de população rural dispersa e rara, muito devem, justamente, ao contacto entre duas regiões geogràficamente crentes, a dos platôs férteis que tiveram cedo uma grande densidade de população camponesa, e a das planícies pantanosas e cheias de florestas, onde César se viu obrigado a manter uma luta de guerrilhas. Mas, quando se estabeleceram correntes de comércio, no lugar onde se efetua o contacto das duas regiões geológicas e topográficas, onde a circulação nas estradas é substituída pela circulação fluvial, com baldeações e com os mercados que daí nascem inevitavelmente, uma floração urbana pode aparecer; a situação das cidades flamengas baseia-se nas relações entre as duas regiões naturais do País Alto e do País Baixo.
Quando se olha o mapa administrativo paulista e quando se o compara com mapas topográficos e geológicos, um fenômeno da mesma ordem aparece: o grande arco de círculo que ocupam sobre o mapa os terrenos do permiano, é marcado por uma série de cidades, das mais velhas do Estado: Itararé, Faxina, Itapetininga, Sorocaba, Campinas, as duas Moji, Casa Branca e mesmo Mococa, todas estão em contacto com os terrenos fracamente ondulados do permiano e com cadeias cristalinas, ramificações da Mantiqueira, da Serra do Mar, ou da serra de Paranapiacaba. Assim, ainda no vale do Paraíba, o rosário das velhas cidades desde Barra do Piraí até Moji das Cruzes, cadeia de lugares de pouso, é ligado a este grande eixo topográfico que tanto pesou e ainda pesa na história brasileira.
Vê-se facilmente nos exemplos precedentes o quanto deve a cidade à sua posição: paradas obrigatórias dos viajantes e das tropas antes ou depois da travessia de zonas de relevo marcado, etapas sobre uma grande via natural de comunicações, as cidades citadas gozaram na sua formação e no seu crescimento de uma superioridade natural. Às vezes, uma cidade parece ter nascido numa situação geográfica paradoxal e como que a despeito da geografia. Lembremo-nos de que o Rio de Janeiro foi uma verdadeira ilha urbana durante longos anos: era por mar que se atingia Angra dos Reis para escalar em seguida a serra do Mar e a Mantiqueira e ainda no tempo de Mauá era de barco que se chegava à extremidade da baía de Guanabara para tomar a estrada de ferro de Petrópolis. Mas esta posição que foi desfavorável até o completo desenvolvimento da circulação ferroviária e rodoviária, oferece hoje bem considerando, mais vantagens que inconvenientes: o fator geográfico é permanente, mas os homens mudam e, com eles, suas técnicas.
Só posso dar aqui indicações gerais, mas é preciso dizer que não são algumas simples frases suficientes para caracterizar a situação de uma cidade: croquis e mapas são mais úteis neste caso do que em qualquer outro e não se deve ter medo de entrar em pormenores. Ter-se-á talvez a impressão de dizer verdades primárias e de descobrir a lua, mas não é mau ter os pés solidamente fixos ao solo e lembrar fatos, embora muito conhecidos: isto constitui uma garantia contra os vôos da imaginação.
Quanto ao estudo do local urbano, não é outra coisa senão o estudo da situação, mas esta vez local e não mais regional. Os geógrafos têm tentado estabelecer uma classificação das cidades, segundo os tipos de local urbano: cidades de pântano, cidades de meandro, cidades de vale, cidades de cabo, de ilhas, de acrópole, etc.; lendo-se esta classificação, a via de passagem e o cuidado com a segurança parecem os agentes essenciais da escolha efetuada pelos homens. Lucien Febvre mostrou que estas classificações não eram úteis em si mesmas, porém tinham a vantagem de oferecer quadros e indicações para as pesquisas. A importância do local é manifestamente do maior interesse, pois, ao mesmo tempo que a situação, ele justifica a forma atual da cidade e esclarece os problemas que o urbanista deve resolver e os que o administrador encontra todos os dias.
O caso do local de Blumenau parece-me particularmente típico: o Dr. Herman Blumenau fez a primeira exploração do rio Itajaí, sustou a navegação nas primeiras quedas fluviais que encontrou e que marcam ainda o termo da navegação fluvial: eis, portanto, o elemento capital: a cidade nasceu no lugar onde termina a navegação fluvial, o que a coloca num tipo clássico. De outro lado, um pouco abaixo das cachoeiras, dois afluentes sobre a margem côncava do rio constituíam portos naturais e possibilidades para o funcionamento de máquinas hidráulicas destinadas a facilitar a construção das casas de madeira. A montanha que tomba abruptamente sobre a margem direita impediu a extensão em profundidade e orientou o crescimento paralelamente ao rio; assim se explica, pela combinação dos diferentes fatores, a forma alongada de Blumenau, que não passa de uma longa rua de vários quilômetros de comprimento; só recentemente é que o aglomerado urbano atingiu os terrenos baixos dos dois pequenos afluentes, não tanto com as grandes fábricas têxteis e as casas operárias, mas com o bairro de residência elegante dás famílias dos industriais. Toda medalha, entretanto, tem seu reverso; todo local tem seus inconvenientes; os ribeirões afluentes, ribeirão Garcia e ribeirão da Velha, não podem escoar suas águas nos períodos de cheia, sendo mesmo invadidos pelas do rio Itajaí; por isso Blumenau sofreu muitas vezes inundações e o problema não está ainda resolvido. No estado de São Paulo, a localização das cidades sobre o espigão onde correm paralelamente a fita de estrada de rodagem e a das estradas de ferro é um fato já antigo, mas sistematizado nos nossos dias: Franca, situada entre vastas pastagens numa região descoberta, semeada de capões de mato e recortada por profundos vales, cresceu sobre três espigões ligeiramente inclinados para o sul; as voçorocas que se cavam facilmente nas areias, dão-lhe quase um aspecto de cidade naturalmente fortificada, mas limitam a expansão urbana em certas direções[7].
O interesse que há em colocar o local estudado em um dos tipos já classificados não deve fazer perder de vista os fins precisos a que se propõe a monografia: de que vantagem dispôs o homem para estabelecer a cidade? Como essas condições locais auxiliaram ou entravaram o desenvolvimento da cidade e a forma material que ela imprime na paisagem? De que soluções necessitaram? Assim também evitar-se-á concluir muito depressa por uma influência absoluta do local. Há sempre uma escolha do homem, consciente ou inconsciente. Há 30 anos ensinava-se que Paris tudo devia à Ilha da Cite; é certo, mas não se deve esquecer que o vale do Sena nesta parte do seu curso onde passam as estradas que ligam as regiões do Loire às planícies do norte, apresenta muitas outras ilhas, idênticas em todos os pontos à Cite, e que apenas o acaso fez fixar-se uma aglomeração neste ponto preciso, e não um pouco abaixo ou um pouco acima. Assim também todos os aglomerados que se sucedem ao longo da linha da Paulista na região de Marília, ao longo da Sorocabana, a partir de Ourinhos, ou ao longo da Estrada São Paulo-Paraná, têm todos os mesmos locais, com pequeninas diferenças, e sua localização precisa depende de necessidades ferroviárias, de circunstâncias econômicas, de um ato da vontade humana. Chegamos aí a um elemento irredutível.
Situação e local, análise de uma e do outro, mas sem menosprezar o que une uma ao outro, sem esquecer que a distinção tem um valor apenas metodológico. Se se quiser um belo exemplo disso, deve-se ler o capítulo dedicado a Nova Iorque, por Henri Baulig, no seu livro sobre os Estados Unidos[8]; Nova Iorque, por muito tempo cidade de segundo plano, tomou impulso quando o vale navegável do Hudson foi ligado aos grandes lagos pelo canal Erié, quando se tornaram possíveis comunicações fáceis com uma imensa e rica hinterlândia; essa vantagem latente da situação era apenas a conseqüência do fenômeno geológico das fraturas e da glaciação quaternária do solo: as primeiras fixaram o curso do rio, a segunda assegurou-lhe um leito profundo servindo para navios de calado relativamente grande; mas, os mesmos fenômenos que modelaram as formas do terreno no nordeste americano também marcaram os detalhes da topografia e prepararam o local da metrópole; uma vasta enseada protegida, mas de acesso difícil em tempo de bruma, facilidade de construção dos diques perpendicularmente às margens do Hudson c do East River, forma alongada da península de Manhattan, ruas estreitas nesta delgada faixa de terra que o gelo outrora aplainou entre os dois braços do fiorde, disposição das grandes artérias modernas, tudo isto é também conseqüência dos fatos geológicos e geográficos: a Broadway e a Quinta Avenida são produtos da glaciação. Só muito arbitrariamente podem separar-se os elementos do local e os da situação.
Em São Paulo, a situação da cidade está em relação com os eixos de comunicação, seja em direção no vale do Paraíba pela planície cheia de meandros do Tietê, com a depressão periférica fortemente encaixada entre os anéis de rochas cristalinas, pelo vale do mesmo Tietê, seja enfim em direção a Santos, graças aos vales do Alto da Serra; não é, pois, o seu local o resultado dos mesmos fenômenos epirogênicos que, por uma sucessão de níveis de erosão, resultaram na formação dos platôs das areias do terciário entre os rios Tietê, Anhangabaú, Tamanduateí e Pinheiros? Estes vales de superfícies planas, nos quais os rios traçaram um labirinto de meandros, facilmente cavados nas areias cobertas por uma vegetação fraca de campos, ao mesmo tempo fixaram os eixos de circulação que fazem de São Paulo o núcleo das comunicações sobre o platô e apresentaram aos urbanistas problemas que estes apenas começam verdadeiramente a resolver. A base geográfica da capital paulista é apenas um parágrafo da história do relevo do Brasil tropical atlântico. O historiador preocupa-se com as origens da cidade e o geógrafo, analisando as condições geográficas de localização da mesma, traz sua contribuição ao trabalho do historiador. Em troca, este, determinando as condições humanas da fundação da cidade, fornece indicações que o geógrafo utiliza. Deffontaines apresentou um resumo tão claro quanto preciso dos diversos tipos de cidades brasileiras segundo suas origens, resolvendo, de um modo bastante feliz, as questões dos patrimônios autênticos, inspirados por verdadeiras considerações religiosas, e dos patrimônios modernos, leigos[9]. O papel das capelas e dos santos nas origens urbanas no Brasil é de há muito reconhecido, mas não foi ainda inteiramente definido. São muitos os textos contando que Fulano doou um terreno e o capital necessário para a construção de uma capela e que uma cidade formou-se rapidamente em torno desta; mas, ao que me consta, nunca se procurou saber se motivos de ordem mais concreta não inspiraram igualmente o doador, como, por exemplo, a venda ulterior de terrenos assim valorizados, ou o desejo de ver constituir-se um pequeno núcleo de mão-de-obra; os motivos que determinam hoje a abertura de patrimônios não existiriam já no período colonial? A Idade Média européia oferece muitos exemplos dessas fundações urbanas (ou outras) que apresentam um misto extraordinariamente humano de religiosidade e de senso de negócios. Todo estudo histórico supõe a existência de arquivos e, infelizmente, os que nos interessam não são nem em grande número, nem de consulta fácil, entretanto, quaisquer que tenham sido as diferenças entre a Europa do século XII e o Brasil colonial, pode-se pensar que essa pesquisa não é a priori impossível. Seria para mim, motivo de alegria ser informado de que verdadeiros Historiadores, dotados de vasta cultura histórica capaz de fazer nascer hipóteses de trabalho nos seus espíritos e possuindo o gosto e o senso da crítica dos textos, abordaram o problema das origens das cidades brasileiras. É um voto formulado por um leigo e os historiadores dirão se é possível atendê-lo. Mas, não deixa de ser verdade que estas fundações devotas serviram de pontos de ligação e de núcleos de agrupamento; não é isto uma prova da sua inteligente localização? Teriam elas conhecido destinos social e economicamente tão belos, se tivessem sido efetuadas em condições geográficas hostis? De todos os modos, a base geográfica desempenhou o seu papel e eis o que preocupa antes de tudo o geógrafo[10].
O estudo da situação e do local não pode se resumir apenas à descrição dos elementos geográficos: é preciso mostrar, concomitantemente, como os homens tiraram partido dos mesmos, de modo mais ou menos feliz, segundo as épocas: não bastaria enumerar os morros do Rio, ou descrever a planície santista e suas epidemias de febre amarela; é preciso ao mesmo tempo dizer como o Rio se insinuou entre os morros, adquirindo assim a forma multicelular que lhe conhecemos, como foram demolidos, ou perfurados esses relevos pitorescos, como foi drenado o pântano de Santos; é preciso dizer como e quando. Vai assim a geografia solicitar elementos à história e ao urbanismo.

A evolução urbana

É o dinamismo dos homens e de suas obras que é necessário trazer à luz, se quisermos ser fiéis à realidade. Conseqüentemente — lembro isto apenas por prudência — a evolução urbana deve ser estudada sob seus diferentes aspectos, mas sempre do ponto de vista geográfico. Por isso, em primeiro lugar convém analisar a "evolução do espaço”, as etapas, não mais apenas de sua formação, mas de sua progressão, o ritmo e as circunstancias dessas etapas. O modo mais perfeito de garantir o sucesso desta parte da monografia urbana é reunir um bom número de plantas da cidade em épocas diferentes, escolher em seguida as mais características, por exemplo as que, separadas por intervalos de tempo nem muito curtos nem muito longos, foram estabelecidas em datas criticas no passado da cidade e, finalmente, analisar essas plantas. Datas críticas não significam datas correspondendo exclusivamente a acontecimentos administrativos (embora estes sejam interessantes na medida em que, como a promoção à categoria de município, sancionam um estado de coisas), mas fatos de ordem econômica ou demográfica: a planta da cidade levantada na época para a qual se possui recenseamento, na ocasião da inauguração da via férrea, antes ou depois de um grande trabalho de urbanismo, nos anos que se distinguiram por uma crise ou um grande surto, econômico regional, etc. A análise que acompanha a descrição desses mapas sucessivos da cidade visa explicar o porquê dos fatos e, sendo uma análise cartográfica, o porquê das direções inscritas sobre o mapa. O caso de uma cidade como Paris que, até os anos de 1920 permaneceu rodeada por uma cinta de fortificações, apresenta a vantagem de fornecer documentos exatos: os limites da cidade por ocasião da construção de suas diferentes muralhas; mas, tem também o inconveniente de apresentar uma forma constantemente regular, a que Paris conserva ainda mesmo atualmente, que- torna mais difícil a percepção sobre os mapas dos impulsos do organismo em certas direções. É preciso então examinar a superfície construída ao abrigo das fortificações. Entretanto, um rápido golpe de vista sobre a forma atual de São Paulo basta para mostrar a que ponte os tentáculos que a cidade projeta são justamente ligados às direções essenciais de seu comércio e a Revista do Arquivo Municipal já publicou estudos do mais alto interesse sobre este assunto. O caso da cidade de Casa Branca foi analisado bem minuciosamente num trabalho apresentado ao Congresso de Geografia[11]: utilizando a descrição que dela dá Saint-Hilaire, foi possível reconstituir aproximadamente o núcleo central e sua posição à beira d'água; progressivamente as construções subiram pela encosta do vale e a edificação, em 1852, da Igreja Matriz, no lugar onde ainda se encontra, permite medir o crescimento que se acelerou na época do estabelecimento da via férrea (1875) e é justamente em direção à estrada de ferro, longe do rio ao lado do qual se tinham instalado os fundadores da cidade, que esta vai se desenvolver. Assim também mesmo sobre o mapa topográfico com escala de 1/100.000 distingue-se nitidamente e como Franca estendeu-se para o oeste em direção às linhas da Mojiana, e isto a despeito do relevo: para atingir a estação, a cidade saiu de seu local primitivo no espigão[12]. Marília fornece um caso interessante de desenvolvimento urbano em relação a um conjunto de fatos econômicos: nascida no bom período do café de 1926-28, pelo estabelecimento de patrimônios, foi surpreendida pelo cataclisma de 1929; este não deteve totalmente a marcha progressiva, mas retardou-a, a julgar pelo gráfico da construção anual dos edifícios que marca uma ligeira estabilização. Mas, a partir de 1932, e mais ainda, de 1933, graças à venda de pequenas propriedades, ao afluxo de colonos sobretudo japoneses e ao desenvolvimento da cultura algodoeira, Marília recomeçou a avançar mais brilhantemente do que nunca: as construções intensificam-se e a cidade aumenta em superfície pelo estabelecimento de novos patrimônios em 1934 e 1935. Como a produção do algodão acarreta o estabelecimento de máquinas de beneficiamento e mesmo destilarias, e como estas construções industriais procuram ao mesmo tempo os terrenos baratos e a proximidade da via férrea, o avanço se faz não só de um lado e de outro das linhas da estrada de ferro como também paralelamente às mesmas e à estrada que avança para o sertão.
Assim, as estatísticas vêm em apoio do mapa e os fatos locais devem ser recolocados sem cessar no quadro mais vasto dos acontecimentos regionais ou mesmo nacionais, continuando-se a examinar como se inserem no quadro preciso e imutável dos elementos geográficos. No decorrer dessas transformações, a cidade adquire às vezes caracteres totalmente novos relativamente aos que podiam auxiliar a sua classificação nos seus primeiros anos. Não seria esse o caso do Rio de Janeiro que, tendo tido sua origem nas ilhas da baía de Guanabara, se desenvolveu nas terras baixas como uma cidade de golfo e, num estágio moderno, avançou para o oceano, como uma cidade de cabo, escalando nos mesmos anos as encostas das montanhas, quando os meios de transporte e as técnicas da engenharia tornaram possíveis os longos percursos, a abertura de túneis, a supressão radical dos morros e a construção das estradas de montanha? A parte baixa de Salvador progrediu sensivelmente e o centro dos negócios instalou-se aí quando puderam ser conquistados terrenos sobre o mar e quando as passagens para a cidade-alta, onde estão os velhos monumentos, foram facilitadas. Assim, a análise desta evolução da forma da cidade leva a reconsiderar os problemas do local. A morfologia urbana não dispensa a genética urbana.
Mas, a cidade é apenas um conteúdo; é o resultado do trabalho dos homens, abriga-os e os faz viver. “Quem são estes homens? Quantos são?” Eis um novo elemento a considerar e, como sempre, não somente na situação presente, como também na do passado, pois foram os homens de ontem que fizeram a cidade de hoje. O estudo urbano não pode prescindir de uma parte demográfica: o aumento da população urbana e seu ritmo evolutivo confrontados com o que já se sabe das transformações da cidade do passado, fornecem dados novos para melhor se acompanhar a progressão urbana. Estagnação da população e fraco aumento da cidade, avanço demográfico e aceleração do ritmo urbano, tudo isto deve também entrar na monografia: em alguns anos, no lugar onde se erguia a mata virgem, nascem as cidades das zonas pioneiras e a curva do gráfico da evolução da população é quase uma vertical. Mas, por quanto tempo se prolongará esse crescimento? Ao período de juventude sucederá talvez muito depressa uma maturidade precoce, até mesmo á fossilização. E, sem tomar o lugar do especialista da demografia e da estatística, o geógrafo pode com proveito consultar as taxas de natalidade e mortalidade, e a composição por idade e sexo da população. Aí encontrará elementos que também o auxiliarão a compreender e a fazer compreender o que é esse aglomerado[13].
“A população urbana não evoluiu somente quanto ao volume, mas também quanto à distribuição”: a distribuição das densidades de população em relação à superfície e suas variações no tempo para o conjunto da cidade e para os diferentes bairros, trazem um novo elemento cartográfico e perfeitamente geográfico. Nas grandes capitais é regra os bairros centrais tenderem a diminuir sua população permanente, em proveito dos bairros da periferia, enquanto, por outro lado, batem todos os recordes de densidade diuma. Tais fatos não são verdadeiramente caracterizados senão nos agrupamentos urbanos importantes, sendo suscetíveis de uma investigação completa apenas se se possuir uma documentação estatística e cartográfica extremamente rica, para o passado e para o presente. Mas, todas as vezes que este estudo é realizável, fornece resultados particularmente eloqüentes. Além disso, na falta das estatísticas de densidade humana, podem ser obtidos dados equivalentes consultando-se cuidadosamente as listas de distribuição das habitações[14].
Estudo da massa humana, estudo da sua distribuição, não é tudo ainda: deve-se saber também quais são os elementos humanos em si mesmos e se, na história, a vinda de um novo elemento não deu lugar ou não acompanhou uma expansão da cidade. Convém, então, observar também a etnia urbana. A população de uma grande-cidade tem origens extremamente diversas: é difícil encontrar um parisiense cujos pais sejam nascidos em Paris, é muito raro encontrar outro cujos quatro avós sejam autênticos parisienses. Essa mistura dos elementos nacionais nas capitais tem uma importância enorme para o aspecto mesmo da cidade, para sua cor local, e suas repercussões políticas são ainda mais essenciais. Nos países onde as correntes de imigração são fortes e variadas, onde homens de cores diferentes se congregam, as maneiras de distribuição dos diversos elementos humanos, no interior da cidade, devem ser sempre analisadas detalhadamente. Lembremos os bairros chineses, negros, judaicos de Nova Iorque ou de Chicago para os quais possuímos estudos bastante precisos que podem guiar os pesquisadores. Notamos, passando numa cidade como São Paulo, a existência de um bairro japonês, de um bairro sírio, o contraste entre dois bairros burgueses: Higienópolis, quase exclusivamente habitado por paulistas de velhos troncos, e o Jardim América onde se agrupam os estrangeiros. E um dos mais curiosos aspectos do Recife é devido aos famosos mocambos onde se aglomeram os infelizes que fogem da seca do sertão e esperam que a cidade lhes dê pão e trabalho.
Resta ainda colocar em mapa a geografia das profissões e das classes sociais: zona dos operários de fábricas, dos trabalhadores de estrada de ferro, dos burgueses abastados e da classe média. Estes são fatos sociais que o geógrafo não sabe e não precisa estudar, mas sua distribuição é um fato de ocupação do solo e traduz-se por matizes do cenário urbano; neste sentido, esta cartografia encontra lugar na monografia geográfica urbana. Na cidade de Casa Branca pode-se notar uma relação entre o mapa das profissões e o dos aumentos da cidade: a parte mais velha à beira do rio é a das lavadeiras e da horticultura; com um ligeiro deslocamento do antigo eixo de circulação, a zona comercial conserva- a forma alongada da Casa Branca de 1870; à construção da via férrea correspondeu a formação de um núcleo habitado pelos ferroviários, enquanto que, depois, da construção da Escola Normal, os funcionários públicos foram se localizando nas suas vizinhanças, etc[15]. A história geográfica da pequena cidade expressa-se através do mapa das profissões.
Não e possível nos determos longamente nos processos a serem utilizados para a confecção destes diferentes mapas: isto varia com os casos e com os elementos de que se dispõe. A gama é rica e cada qual pode escolher o que quiser, desde os mapas mais simples com a representação por pontos, sombreados, hachuras mais ou menos unidas, até os sistemas mais rigorosos, mas que podem servir quase que apenas ao estudo de áreas muito limitadas, escolhidas porque particularmente características, no interior de uma grande cidade — sistema de curvas de nível, brilhantemente exposto e praticado pelo Dr. Bruno Rudolfer, do Departamento de Cultura. O essencial é obter um mapa ao mesmo tempo exato e eloqüente.
A realidade móvel não é o homem de um lado e do outro o espaço urbanizado; é a cidade, no seu aspecto e na sua vida que o geógrafo procura descrever e explicar. Neste ponto do trabalho, é tempo de dar ao leitor algo mais que um estudo friamente científico. Sem cair no guia turístico, a monografia urbana pode sugerir o que é, material e espiritualmente, esta cidade cujo mecanismo se desmonta não sem o retalhar arbitrariamente para maior facilidade de exposição. Uma cidade é um conjunto de bairros rios quais cada um tem sua fisionomia, resultante da sua função, dos seus habitantes da sua idade. Todos estes bairros, mais ou menos bem integrados entre si, formam a cidade. Um bairro urbano é algo diferente de um fenômeno social, como localização de uma base ou de uma categoria de trabalhadores: um bairro urbano tem uma feição que só a ele pertence, uma vida particular freqüentemente bem desenvolvida, uma alma. Mas, tem também suas razões de ser que a topografia e a história podem explicar. Ainda aí se impõe a cartografia, ao mesmo tempo que a comparação deste novo mapa dos bairros com os outros dados cartográficos elaborados precedentemente: mapa do relevo, mapa da evolução, mapa das densidades e das raças, etc[16]. Lembremos o caso do Rio de Janeiro que possuiu um bairro aristocrático nas vizinhanças da Quinta da Boa Vista e que viu suas populações mais miseráveis subir pelas encostas dos morros para estabelecer as tristes favelas; atualmente, é em direção ao ar marítimo de Copacabana, de Ipanema e ainda mais longe, é em direção ao ar fresco c renovado das alturas de Santa Teresa e mesmo da Tijuca, que se deslocam os bairros de residência, enquanto entre o mar e as colinas de Santo Antônio localiza-se apertadamente o bairro ativo. Há em tudo isso causas geográficas de que Deffontaines deu alguns esboços. Em São Paulo, o velho bairro dos Campos Elísios cedeu o lugar a Higienópolis; o Triângulo, com seu largo do Café, viu emigrarem para além do vale do Anhangabaú as lojas de luxo; e estas já avançam para o largo do Arouche. Será incompleto o estudo urbano, se não reservar um largo espaço à descrição e ao dinamismo de cada bairro. Pode-se procurar sistematizar a distribuição dos diferentes tipos de bairros, como fizeram os americanos: a área urbana assemelhar-se-ia a uma série de círculos concêntricos e cada um seria assim caracterizado: uma zona central de negócios, uma zona de transição (ou de deterioração), o círculo dos trabalhadores, o circulo da classe média e a borda suburbana. Com a condição de não procurar enquadrar de qualquer modo o caso especial estudado nesta sistematização, há interesse em utilizar esta hipótese como fio condutor. Vê-se logo que ela supõe um bem longo passado para a cidade: os organismos urbanos de criação recente onde o mais perfeito zoneamento foi aplicado, não sofreram ainda bastante a ação do tempo para que a diferenciação manifesta dos bairros tenha sido atenuada pelo efeito de imponentes quarteirões diferenciados. São como uma célula em vias de fragmentação. Assim, dificilmente se pode em Marília separar os bairros de residência proletária dos bairros de habitat burguês: fora da zona central do comércio e dos transportes, fora das casas muito pobres localizadas mesmo às portas das grandes fábricas, todos os elementos se mesclam e o cenário urbano dá uma impressão de tumulto.
O habitat urbano e a circulação urbana contribuem para precisar os traços de cada região da cidade. Ao mesmo tempo que se dá, justamente, uma grande importância ao estudo do habitat rural, tem-se talvez uma forte tendência, nas monografias urbanas, a desprezar a casa. Esta é também uma expressão do meio geográfico: não são os arranha-céus de Nova Iorque conseqüência da estreiteza da península de Manhattan, como os do Rio decorrem da fraca extensão dos terrenos planos das faixas do litoral? A cidade pioneira de barracas de tábuas manifesta seus primeiros sintomas de maturidade quando se multiplicam as casas de tijolos; a quantidade de casas de estilo futurista nas cidades paulistas parece-me o critério mais certo para a medida de sua prosperidade. O comandante Quenedcy, autor de um excelente estudo sobre a casa urbana em Ruão, traçou um programa de estudo da habitação urbana que, embora feito para a França, pode também orientar as pesquisas em outros países, mesmo nos "países jovens": estudo do subsolo e da superfície, dos materiais disponíveis, do clima-(o vento, a nebulosidade, a temperatura), meio urbano, população, modo de construção, distribuição e decoração; eis aí um conjunto de questões a serem focalizadas, adaptando-as ao Brasil, ou melhor, a cada região do Brasil[17].
Se o estudo da habitação urbana ajuda a definir o aspecto de cada bairro, em cada época da vida urbana, o da circulação mostra como se constitui o liame que une todos os bairros: a circulação é a causa da vida que anima o organismo. Ora, esta circulação depende antes de tudo da topografia que condiciona o estabelecimento das ruas e das estradas. Ninguém poderá imaginar o Rio de Janeiro, ou São Paulo, ou Salvador sem conhecer os problemas que o relevo opôs à circulação e como esta pôde ser facilitada pela abertura dos túneis, pela construção dos viadutos, pelo estabelecimento dos ascensores e funiculares — túneis, viadutos e ascensores que dão às três cidades um aspecto exclusivamente seu[18]. E Recife, entre os braços dos rios e as lagoas, resolveu seu problema de circulação pelo levantamento de pontes que ligam entre si as células do organismo urbano.
Os meios empregados para facilitar a circulação têm variado com o tempo e os processos de transporte modernos têm sido uma das condições da extensão das grandes cidades: o impulso do Rio ao mesmo tempo para, as grandes praias e para a extremidade da baía só se tornou possível com a circulação por meio de automóveis e as boas avenidas. Nos vales de superfície plana de Blumenau, a população meio operária, meio rural, utiliza a bicicleta para resolver o problema da distância, muito longa para a marcha e muito curta para que os transportes coletivos possam desenvolver-se[19]. Enfim, as pulsações da vida urbana são expressas pelo número dos passageiros transportados nas diferentes horas do dia, sobre os diversos itinerários[20]. Distâncias, tempo, quantidade, oscilação, tudo isso em função do meio, que a natureza e o passado lhe deram, descobre os segredos da vida urbana e tem seu lugar na monografia geográfica de uma cidade.
Se o mapa, a planta, a topografia e a gravura são os auxiliares indispensáveis desta descrição da vida urbana, isto não quer dizer que, sob o pretexto cômodo de fazer ciência, o estilo deva tomar uma aparência de relatório oficial, administrativo e impessoal. Pois não é conhecer a alma da cidade, depois da de seus bairros, o que se deseja? Na comunicação já citada, Gilberto Freire insistiu muito, e com razão, sobre a "qualidade Sinfônica” da paisagem cultural, rural ou urbana. Escreve ele que “o fato deve ser destacado no Brasil, onde um cientificismo exagerado insiste em levantar-se contra aqueles trabalhos de história e geografia ou de sociologia aplicada em que os autores se aventuram em tentativas de interpretação compreensiva. Afinal o rigor do particularismo objetivista — tão necessário como disciplina e método de análise — pode, pelo excesso, nos levar à inteira desumanização daquelas ciências voltadas para o estudo dos grupos humanos considerados nas, suas relações, ou inter-relações, de tempo ou de espaço". O perigo é exatamente o de “desumanizar", pois ninguém acreditará ter mostrado o homem, quando o apresenta como um rebanho de gado. É tempo de fazer uma injeção de Elisée Reclus na geografia dos sinclinais e das estatísticas, assim como na sociologia que acredita exprimir o real, enquadrando-o em equações. Antes de escrever, o geógrafo deveria pôr-se em contacto com a literatura, no sentido estrito da palavra, que existe sobre a cidade estudada: os arquivos, as estatísticas, os planos dos urbanistas, não ensinam mais que o passeio das moças no domingo à tarde na praça pública da cidade pequena, ou que as cores, os sons, os odores da grande avenida principal da Capital, a multidão dos operários em - alvoroço à saída da fábrica e a luz de um belo dia de sol sobre as areias vermelhas e os arranha-céus[21]. Mas que não se despreze, também, "o rigor do particularismo objetivista, tão necessário como disciplina e método de análise", Paul Morand escrevendo sobre Nova Iorque e Londres, Jules Romains evocando o apito do rebocador do Sena furando a bruma de inverno de Paris, não pretendem fazer obra de geógrafos ou de sociólogos: não tenhamos por nosso lado pretensões literárias, A interpretação estética dos fatos geográficos é às vezes utilizada para fins, pouco honestos; deverá ser usada apenas para emprestar uma certa qualidade de alma a paisagens urbanas e rurais, qualidade que às vezes tem uma necessidade singular de espaço vital; .mas defendamo-nos de uma vague à l`âme que se esconde nas penumbras da floresta herciniana é evitemos do mesmo modo uma eloqüência demasiado latina.

A função urbana

O homem e suas obras, colocados num meio geográfico definido, eis o que constitui o organismo urbano. Mas, um organismo tem uma função e esta função modifica-se ao mesmo tempo que o organismo evolui. Chegamos a um novo capítulo do estudo urbano: a análise da função. Esta pode parecer infinitamente mais desembaraçada das condições naturais do que a atividade de um grupamento rural, que trabalha diretamente sobre a natureza: administração, bancos, casas de comércio, indústrias de todos os tipos, Universidade, tudo o que oferece uma grande cidade tem qualquer coisa de artificial e de imposto pela vontade coletiva às possibilidades naturais. Se se consideram as transformações, no decorrer dos séculos, da função urbana, é ainda reforçada a impressão de uma autonomia total em relação ao meio geográfico, e isto principalmente nas enormes metrópoles modernas. Neste caso — pode-se objetar — a geografia urbana dissipa-se em fumaça? A menos que este modo de ver provenha de um conhecimento insuficiente da realidade e corresponda a uma compreensão má da geografia humana. Se se partisse da convicção a priori de que só há geografia quando há influência tirânica da natureza sobre as sociedades humanas, o estudo geográfico da função urbana estaria logo liquidado. Mas, se a geografia humana pretende somente mostrar como o agrupamento humano aproveitou o que a natureza colocou à sua disposição, se ela se limita a desmontar o mecanismo das ações e interações do meio e das sociedades, no espaço e no tempo, o estudo da função urbana coloca-se normalmente na monografia geográfica. Toda obra humana coletiva, gravada na paisagem por traços materiais, foi feita com a natureza ou apesar dela, e pode-se pensar que as maiores cidades modernas são o tipo mais acabado de uma perfeita adaptação da técnica humana às condições do meio. Acrescentemos que a função urbana concretiza-se por elementos cio cenário urbano e que suas transformações muitas vezes determinaram us crises de crescimento ou de estagnação do organismo. Fiz já uma alusão a Madri: por muito tempo se disse que Filipe II tinha arbitrariamente escolhido este humilde burgo castelhano para dele fazer a capital de «eu reino unificado, sem se preocupar com as condições geográficas. Nada menos exato. Filipe II teve, ao contrário, um senso muito agudo da geografia, quando, ao procurar uma cidade capaz de simbolizar a unidade de Castela e Aragão, deixou de lado as principais cidades espanholas já cheias de passado e de glória e escolheu, para erigir sua capital, um lugar situado quase no centro geográfico da Península Ibérica, num ponto onde se cruzam os grandes eixos da circulação de toda a península; fazendo geografia sem história, condenou-se Filipe por ter construído sua corte numa região selvagem e sem florestas; mas, no século XVI, os arredores de Madri eram ainda cobertos de matas que serviram para a construção das casas. Quando se considera a fundação de Madri, através das condições naturais econômicas e comerciais do século XX, é exato dizer que a cidade foi imposta ao meio geográfico e que é um paradoxo geográfico. Mas, quando se pensa verdadeiramente como geógrafo, isto e, com o hábito de não dissociar o presente do passado, constata-se que, nas circunstâncias políticas e econômicas, no quadro natural do século XVI, a localização da capital espanhola era perfeitamente razoável[22]. Este exemplo ibérico parece-me bem frisante: a função urbana, mesmo quando política, não é absolutamente independente do meio geográfico e só se torna compreensível com o auxílio do seu passado. Acrescentemos que ela não pode ser dissociada dos acontecimentos de política e de economia gerais. Já indiquei como o desenvolvimento de Marília foi ligado às oscilações da economia paulista; Blumenau, que possui uma ativa indústria têxtil, deve sua função industrial a um concurso de circunstâncias várias: primeiro à presença de águas correntes limpas, úteis à produção têxtil e capazes de alimentar pequenas quedas; em seguida, ao fato de, entre os primeiros colonos alemães, encontrarem-se tecelões saxões que, eu por saudade ou por necessidade, tentaram construir no local um material rudimentar; após um começo incerto, os fundadores das tecelagens de Blumenau Ativeram a oportunidade de comprar na Alemanha máquinas moderna, aproveitando os créditos de pagamento a longo prazo que o Reich concedia facilmente no fim do século XIX, quando de sua eclosão industrial a sua conquista dos mercados externos. A função industrial de Blumenau resulta, então, essencialmente da situação política e econômica da Europa há meio século. Mas, esta função industrial que, de algum modo provinha de fora, teve por conseqüência a extensão da i cidade, a formação de uma população ao mesmo tempo rural e operária que anima as ruas e os arrabaldes. Não seria possível descrever nem interpretar Blumenau de hoje, fato geográfico, sem o conhecimento de sua função industrial e de suas origens políticas. Ura último caso ainda: o do Rio de Janeiro que leve um brusco desenvolvimento, depois da chegada de D. João VI: a população aumentou rapidamente, o aspecto da cidade modificou-se de todo, deu-se como que uma nova fundação do Rio de Janeiro; e este segundo fundador, pensando bem, foi Napoleão. A cidade carioca, que não tinha até então o monopólio do poder político no Brasil, adquire uma função administrativa que se amplia e se estende sem cessar; certamente, o Rio é também centro comercial, possui fábricas, que se localizam com freqüência fora da cidade, muito quente e muito úmida, mas é antes de tudo cidade de turismo e cidade política. Não encontrando nos seus arredores imediatos tudo o que é necessário à sua subsistência, é obrigada a importar mercadorias de Iodos os Estados do Brasil; para seu pessoal administrativo e político, deve também importar homens de todas as regiões do continente brasileiro; é a única das grandes cidades do país que está, através do elemento material e do elemento humano,-em relações estreitas com todo o país; esta situação provém em grande parte do fato de não serem suficientes os seus pântanos e montanhas para a sua alimentação. Esquematizando a realidade, podemos dizer que o Rio, por muito tempo condenado a um isolamento quase insular, conquistou o mercado nacional. Estas relações constantes e crescentes com todas as outras regiões brasileiras reforçaram cada vez mais sua função política e prepararam a centralização. Assim, ao lado das contingências humanas, encontramos de novo as condições permanentes do local e da situação agindo de modo constante e decisivo sobre os destinos urbanos.
A função urbana não é menos interessante numa cidade pequena do que numa capital; é aí menos difícil de estudar e seus diferentes elementos decompõem-se mais facilmente. É a função comercial, ligada à presença dos meios de transporte, mais freqüentemente, a razão de ser das pequenas cidades do interior: fazendeiros, colonos, sitiantes, trazem suas colheitas e compram as roupas e os instrumentos de trabalho de que necessitam. As grandes empresas comerciais estabelecem postos (produtos químicos, farmacêuticos, casas de fazendas como as "Pernambucanas", depósitos de fumo e cigarros, etc,). Esta função comercial concretiza-se pelo grande número de lojas de todos os tamanhos, onde se amontoam freqüentemente os mais variados produtos, desde livros, uísque e violas, até rolos de arame farpado, arados, sacos de sal, etc. Naturalmente, esta atividade comercial é tanto mais intensa quanto mais importante for a cidade, e sua função pode ser local ou regional: não seria possível comparar a função comercial de São Paulo com a de Botucatu. Notemos que o papel de centro,de comércio é muito mais acentuado nas cidades das zonas novas do que nas regiões de povoamento antigo: cidades como Marília, Uberlândia, Presidente Prudente, são lugares de grande raio de ação e a "boca de sertão" é um grande empório[23]. Esta situação resulta dos meios de transporte: quem diz mercado, diz estrada, A famosa feira de Sorocaba fixou-se ao contacto das regiões de campos e de matas, sobre uma velha rota de comércio e de penetração; a cidade "boca de sertão" atrai o comércio por ser o término da via férrea e o ponto de partida das estradas percorridas pelos caminhões, que distribuem ou recolhem mercadorias. A posse de boas vias de comunicação é inseparável da função comercial. Vê-se como Botucatu, que foi "boca de sertão", tornou-se o entroncamento das duas linhas da Sorocabana; a que se dirige para o Paranapanema e a que chega a Bauru; daí um tráfico rodoviário ativo, baldeações de vagões, oficinas de conserto e presença dos empregados da estrada de ferro. Mais além, Bauru é a capital comercial da Noroeste por ser o ponto terminal da estrada Noroeste e porque as linhas da Sorocabana e da Paulista aí convergem. A isto acrescentou-se a circulação por automóvel, e Marília, centro de comércio e grande estação, é também o ponto por onde passam obrigatoriamente os viajantes que vão da Noroeste à Alta Sorocabana, Encruzilhadas, entroncamentos de vias férreas, pontes, portos ou lugares de pouso — os caracteres geográficos do local facilitam a eclosão do centro urbano e de sua função comercial.
Mas, o café, o açúcar, o arroz, o algodão, a mandioca que os fazendeiros e sitiantes trazem e vendem na cidade, não podem ser consumidos como se apresentam: devem passar por uma transformação industrial: a função industrial pode ser modestamente representada pelas serrarias, pelas máquinas de beneficiar e é todavia capaz, mesmo sob esta forma reduzida, de fazer uma cidade embrionária passar rapidamente a uma atividade caracterizada. Eis por que, na medida do possível, é conveniente pesquisar as datas de instalação dos estabelecimentos industriai s e comparar estes novos dados com o que já se sabe do passado urbano. Nesse estado de seu desenvolvimento, a pequena cidade brasileira é uma reedição da cidade medieval: como esta, ela tira as fontes de sua atividade da zona rural da qual é soberana. A unidade econômica e psicológica é baseada na união constante do campo e da cidade que não tem ainda sua autonomia e não trabalha ainda independentemente das necessidades ou dos produtos de seu plat pays como se dizia na Flandres medieval.
Sabe-se bem que esta evolução não é constante: não somente aglomerados que pareciam dever passar ria fase de mercado puro e simples, à de centro industrial local, não atingem este estádio, como também a presença da função industrial pode ter origens diversas; aparece às vezes com a própria cidade, como c o caso das cidades de mineração, c talvez as montanhas de ferro de Minas conheçam em breve as cidades barulhentas, produtos da mina, como o foram Sabará, Ouro Preto, etc[24]. Às vezes, a função industrial é uma função de substituição ou desempenha apenas um papel complementar: o desaparecimento elas feira s de burros foi um golpe sensível para Sorocaba que só se refez com o aparecimento de uma indústria têxtil; tal como Jundiaí antigo ponto terminal da São Paulo Railway, antigo ponto de concentração das tropas de café e que se torno u uma cidade de indústrias; ou, ainda, como Limeira, que possui fábricas de máquinas agrícolas. A função industrial nasce, portanto, porque os transportes favorecem um empreendimento, etc. A função industrial como complemento de uma outra função é freqüente nos portos ou nas grandes estações ferroviárias, com razões evidentes: transformações das mercadorias baldeadas, facilidade e menores despesas de transporte, abundância de mão-de-obra. A indústria carioca corresponde bastante a um tal estado de coisas. O caso de Santo André nos arredores de São Paulo mereceu um rápido estudo geográfico que mostrou como este aglomerado, erguido sobre um solo fértil, num clima úmido e freqüentemente frio, não pode desenvolver-se enquanto a agricultura predominava nas cercanias da capital paulista. Mas, após o desenvolvimento rápido da indústria, os industriais aí encontram terrenos bem baratos, ao lado da via férrea que une Santos a São Paulo. Atualmente, Santo André é uma cidade industrial, com tendência cada vez maior a constituir um traço de união entremos dois elementos do mesmo organismo que são: Santos, porto marítimo, e São Paulo, cidade dos bancos, das fábricas, das lojas e da administração. Quanto às grandes cidades industriais, o desenvolvimento recente desta função acompanha ao mesmo tempo a extensão da zona de, influencia das plantações; isto, graças ao aperfeiçoamento de suas relações rodoviárias e ferroviárias com a hinterlândia e ao aumento de população da mesma hinterlândia que constitui logo um excelente mercado de consumo. Não seria antes de tudo sob esta forma que se deveria considerar a indústria paulista, pelo menos no seu início? Pouco a pouco a função recentemente surgida toma o lugar da função original e acaba por dar à cidade um aspecto que não tinha até então.
A nossa monografia não deve perder de vista as ligações entre fatos de ordem muito diferente: quais os aspectos da cidade que resultam de cada um de seus elementos funcionais? Quantos dos habitantes da cidade colaboram nesta ou naquela função? Onde se localiza, numa cidade, cada elemento da função, etc.? Acrescentam-se obrigatoriamente outros capítulos do estudo geográfico e, nesta análise, nunca se deve esquecer que a realidade é uma síntese.
Um mercado, um emaranhado de comunicações, uma indústria, tudo isto supõe o nervo da guerra: o dinheiro. A função bancária das cidades é um aspecto que seria errado desprezar. Pois, falar dos homens e de suas, casas é bom, mas se se esquece o dinheiro, nada se disse e apenas se fez aparecer corpos inertes. Por isso, o papel da cidade como centro bancário é também objeto de investigação. Como e com que fundos foram criados os bancos? Que tipos de homens tiveram a iniciativa? Seus nomes não têm importância, mas não ajudaram esses bancos o desenvolvimento da cidade, pelo auxílio dado aos industriais, aos comerciantes, aos construtores de casas? Dir-se-á que nos afastamos demasiado do meio natural. Mas, se se admite que o homem é um agente geográfico, que ele age sobre a matéria natural como uma força natural e que, na nossa civilização, o dinheiro é o instrumento capital do homem, não vejo razão alguma para excluí-lo da geografia. Basta, a bem dizer, falar com um habitante de uma cidade pioneira para constatar como este observador direto e sem preocupações científicas avalia o progresso de sua cidade pelo, número de bancos e a importância de seu  negócios: após a construção das máquinas de beneficiar café, etc., o estabelecimento das sucursais dos grandes bancos é um índice seguro da solidez do organismo urbano e de seu enraizamento.
Enfim, resta considerar um último aspecto da função urbana: a função espiritual. Sob esta denominação, voluntariamente vaga englobo atividades administrativas, escolares, políticas, religiosas e outras mais profanas. Deixemos de lado os santuários religiosos em torno dos quais foram construídas cidades e sobre os quais os sociólogos podem trabalhar com uma competência que o geógrafo não possui. Mas, voltemos a essa cidade imaginária que foi simples mercado, depois possuiu algumas indústrias e bancos e que desempenha também o papel de centro administrativo; aumenta mais ainda, desta forma a sua influência sobre as pessoas da roça que a freqüentam, obrigadas a visitá-la amiúde é que trariam os filhos se fossem instaladas algumas escolas com internatos. Esta função Marília, por exemplo, vai conhecer desde logo; e foi ela, ainda, que permitiu a Casa Branca continuar como cidade depois de terminada a boa época do café. Quando medidas administrativas vêm reduzir o território submetido administrativamente às cidades pioneiras em plena eclosão, estas perdem uma parte de sua clientela: o desmembramento do município de Araçatuba veio quando indústrias e escolas estavam já sòlidamente implantadas e o aglomerado urbano não sofreu com isso; mas, não é certo que a elevação de Pompéia a município e comarca não tenha retardado a marcha do desenvolvimento de Marília. O fazendeiro e o sitiante quando vão à cidade para pagar os impostos aproveitam para fazer compras e para se divertir. Tem-se ouvido muitas vezes evocar os tempos heróicos de Ribeirão Preto e seus cabarés com nomes franceses, os salões de jogo de Barretos nos bons tempos do gado. E um geógrafo, falando de Marráquexe, a cidade santa de Marrocos, definia-a como o "bordel dos montanheses do Atlas". Todos sabemos que essas formas de atividade são, para as cidades, um estímulo que muitas prefeituras invejam; e isto integra-se também no cenário e na alma urbana.
Não nos esqueçamos de que é sempre o cuidado de descrever e explicar o clima próprio da cidade estudada que domina o estudo da função urbana: enumerar os nomes das repartições públicas, as razões sociais das firmas industriais, seria escrever um almanaque urbano. Uma exposição teórica como esta obriga a separar artificialmente os tipos de funções urbanas, as quais, na realidade, são solidárias umas com as outras mesmo as que já desapareceram deixaram alguma herança no presente. Não seria preciso dizer isso em relação às grandes cidades; porém, casos como os de Poços de Caldas e Petrópolis dois tipos de cidades de que não falamos porque são ainda muitos raros no Brasil, mostrarão como diversas funções podem coexistir num pequeno organismo urbano e contribuir para lhe dar a forma e a vida que conhecemos. Poços de Caldas nasceu das águas minerais e foi primeiro uma cidade de águas; depois de alguns anos, ao lado dessa função, concretizada pelas termas, apareceu e desenvolveu-se uma função puramente turística: os doentes não são mais os únicos a freqüentar a cidade: muita gente para lá se dirige também para passar férias; este desvio da função primitiva acarretou a construção de grandes hotéis, de vilas, de um cassino e um aeroporto moderno, isto é, uma modificação do cenário urbano? Mas Poços é ao mesmo tempo o mercado de uma zona rural, não servida pela via férrea, que termina nessa cidade e se prolonga pelas linhas de ônibus; ao lado dos autos de luxo e dos jovens elegantes montados em bicicleta  circulam os antigos carros de bois carregados de cereais — outra função, outro elemento da paisagem urbana[25]. O professor Arbos mostrou como Petrópolis, que devia ser simplesmente um lugar de pouso na estrada de Minas ao Rio, tornou-se estação de veraneio e pequeno centro industrial: três funções concomitantes, todas fundadas sobre fatos geográficos[26]. E este último caso lembra-nos ainda que durante a análise da função urbana não se deve esquecer nem o papel do meio natural, nem a ação preponderante das comunicações nem o dinamismo dos fatos e dos homens.
Raio de ação da cidade — A todo o momento foi preciso apelarmos para as relações que uma cidade mantém com uma região mais ou menos extensa: a metrópole de alguns milhões de habitantes, tanto quanto a pequena cidade flamenga da Idade Média, depende de seu plat pays e age sobre ele. Quais são portanto, as relações mantidas pela cidade com as regiões dependentes (às vezes distantes) e como se realizam elas?
Para seu abastecimento, a cidade, e especialmente a grande cidade industrial, depende das regiões vizinhas e deve criar para si uma zona de subúrbio especializada nas culturas de hortaliças e frutas, pois a alimentação urbana c quase igual à rural. Sabe-se que, por muito tempo, São Paulo e sobre tudo o Rio de Janeiro não possuíram zonas de subúrbio com cultura de hortaliças. Atualmente o Rio tenta a colonização da baixada e da serra; e São Paulo realizou a transformação em chácaras dos fundos vales dos afluentes do Tietê e das encostas dos morros da região de Cotia, São Roque, Santo Amaro, Itapecerica, Embu, etc, em grande parte graças aos imigrantes portugueses e japoneses. Importações de legumes e frutas, mas também de leite, manteiga, carne, peixe, dão lugar a uma atividade para-urbana que está em função dos recursos do meio natural e das distâncias; a cartografia entra outra vez em jogo para mostrar de onde vem os produtos consumidos pelos habitantes da cidade, a importância de cada centro de abastecimento e para se medir as distâncias e os tempos de percurso, assim como as variações de proveniência dos diversos artigos durante o ano. Estas questões são mais sutis nos grandes centros e seu estudo supõe a existência e a publicação dos dados estatísticos das prefeituras, freqüentemente ciosas de seus tesouros adormecidos, o conhecimento dos documentos de que podem dispor as companhias de estradas de ferro, de transporte rodoviário, e ainda os inquéritos pelas cidades, as conversas com os comerciantes, os motoristas, os chacareiros, todos aqueles cujo trabalho assegura aos habitantes da cidade o alimento cotidiano e que possuem um conhecimento simples e completo das coisas. Neste inquérito, um lugar especial deve ser reservado à paisagem da região periférica, que não é urbanizada, mas cujos homens e cujos produtos estão integrados na vida urbana: preparo do solo com grandes quantidades de adubo, extrema delicadeza do trabalho agrícola que se torna um artesanato divisão da propriedade com capitais citadinos — eis todo um microorganismo que requereria sua própria monografia, mas que participa demasiado da vida urbana para não ter lugar no estudo geográfico urbano.
Entre os problemas levantados pelo abastecimento da cidade distinguem-se também os do abastecimento de lenha e água um e outro podem já ter sido esboçados como elementos do local e da situação e sua existência mais ou menos abundante pode ter ajudado a fixação da cidade; mas, as necessidades aumentam, enquanto os recursos diminuem: o deserto substitui as florestas de outrora, e para alimentar e proceder à limpeza da capital, é preciso ir buscar a água muito longe, às vezes a centenas de quilômetros. Os aspectos puramente técnicos dos trabalhos realizados para a adução da água não precisam entrar na monografia, mas as condições do relevo, da constituição do solo, o regime pluvial e as necessidades da população aí encontram seu lugar normal.
O aglomerado urbano requer ainda outra coisa da zona rural que o rodeia: lugares de repouso para os períodos de férias, lugares de descanso e de divertimento para os domingos. A prática anglo-saxônica do week-end atingiu todas as populações urbanas em graus mais ou menos avançados; os esportes, o automóvel, as preocupações de higiene e a instituição das férias, não apenas escolares mas também de trabalho, acarretaram um movimento da cidade para o campo. Na montanha vizinha, mais fresca e, mais verde, na praia, à beira-mar ou à beira dos lagos, as multidões das cidades vão procurar o descanso físico e moral no fim da semana e durante as férias anuais, Não se poderia negar que os exércitos de cariocas que vão todos os domingos a Paquetá, às praias de Niterói, a Petrópolis, ou as legiões de paulistas que vão a Santo Amaro, Sete Praias, Interlagos, Santos ou Jaraguá, dão à vida urbana um aspecto que não possuía há apenas vinte anos. Podem-se cartografar estes movimentos que não se efetuam ao acaso e que prolongam a cidade para além de seus arrabaldes.
Para sua subsistência, para seus divertimentos, para suas indústrias também, que precisam importar matérias-primas, a cidade depende do campo. Mas, por outro lado, ela exerce uma influência tanto maior quanto mais forte for a densidade das vias de comunicações e quanto mais rapidamente percorridas forem as distâncias. Sabe-se que cada vez mais a população das grandes cidades tende a deixar deserto toda noite o centro da cidade e a estabelecer suas casas nos subúrbios: o suburbano parisiense é um tipo humano pitoresco; sai todas as manhãs cedo e volta tarde, encontrando no trem os mesmos companheiros de viagem, todas as manhãs e todas as tardes, discutindo acontecimentos do dia e elaborando lentamente a opinião pública; nos percursos mais longos (para Paris, quase 3 horas), organizam-se intermináveis e animadas partidas de baralho. Também não são desprovidos de pitoresco os trens elétricos do Rio e os “subúrbios" de São Paulo. Mas qual o número desses homens?  Em que medida o seu gênero de vida é rural ou urbano? Por onde vêm eles? Que distâncias percorrem por dia e em quanto tempo? A tendência será para o aumento da população dos subúrbios, mas em que pontos exatos dos subúrbios? E qual o porquê de tudo isto, que não será descoberto, talvez, mas que é preciso procurar? Neste terreno, os mapas são ainda uma vez indispensáveis: mapas de densidades humanas e de superfícies construídas, mapas dos meios de transporte, mapas isócronos e isométricos, mapas das densidades dos meios de transportes nas diferentes direções:, e tudo isso com a preocupação constante de comparar esses documentos cartográficos e os mapas topográficos e geológicos; com o permanente cuidado de pedir à história a explicação que possa dar — velhos eixos de circulação que renascem, pequenos aglomerados outrora autônomos, reservatórios de população que se tornam satélites, indústrias muito antigas que permanecem e se modernizam, trabalhando no concerto industrial da cidade.
As cidades do interior não conhecem esses subúrbios industriais, residenciais e, entretanto, quase rurais, nem esses fluxos cotidianos de população. Mas, apresentam outros problemas: por exemplo., em que medida a população urbana encontra um suplemento de renda. Em certas estações, nos trabalhos rurais? Penso particularmente nas mulheres e nos filhos Já grandes que, morando na cidade, vão participar da colheita do algodão; partem de madrugada e voltam à tarde, indo mais ou menos longe do centro urbano. Outrora, as condições social e o baixo nível de vida das populações do interior paulista explicavam a existência da população urbana relativamente numerosa em relação à possibilidades de ganho e de trabalho as necessidades eram limitadas, as mulheres só trabalhavam no serviços de casa, com um pequeno complemento como lavadeiras, empregadas por algumas horas, etc. Mas, os níveis de vida melhoraram; solteiras ou casadas, as mulheres desejam contribuir para a melhoria do lar. Elas podem encontrar trabalho temporário tanto na cidade, nos packing houses das regiões citrícolas ou na cata do café, quanto fora da cidade, durante colheita do algodão. Constituem uma reserva de mão-de-obra que as pequenas fábricas de fiação e malharia procuram utilizar, mas que eventualmente se emprega fora da cidade.
Necessidades de abastecimento, movimentos de população permitem já conhecer até onde se estende o raio de ação da cidade. Um primeiro mapa concretiza bem estes primeiros resultados: o dos serviços diários de transportes ferroviários e rodoviários. O levantamento deste mapa é fácil quando existem estatísticas que lhe fornecem indicações preciosas; mas é preciso, sobretudo conseguir a dos serviços diários de ônibus que chegam ou partem de uma cidade; poder-se-á encontrar claramente aí quais são os limites extremos das relações mantidas e qual é a área de extensão das mais densas relações. Este mapa é um primeiro elemento para estabelecer, sobretudo para as cidades das zonas rurais, de que região a cidade examinada é a capital regional. Mas, outros mapas devem completá-lo; um localizaria as residências dos pais cujos filhos são pensionistas dos internatos da cidade e um outro, as residências dos possuidores de conta em banco ou, melhor ainda pois a prática da conta em banco não é aqui tão corrente como na Europa ou na América do Norte) , de todos os que tiveram negócios com o banco num ano. Mapas dos serviços diários de ônibus (de sua densidade em cada itinerário), mapa da influência escolar, mapa da influência bancária, eis três documentos que permitem traçar as fronteiras da região na qual a cidade exerce sua influência. O ideal seria poder reconstruir os mesmos mapas para anos transcorridos a fim de chegar a delinear uma evolução da qual a situação atual é apenas um momento. Não seria preciso dizer que as fronteiras desta região de influência urbana não são rígidas: seria mais exato falar de esferas de influência da cidade A, com interferências de cidades vizinhas e rivais, B, C, etc[27].
Esta espécie de guia da monografia urbana que tentei delinear nas páginas precedentes, não pretende conter tudo, nem definir categoricamente a marcha a ser seguida: cada caso exige uma solução e seu modo particular de apresentação. Espero que se tenha, em todo o caso, encontrado aí o essencial e que isto possa ajudar aos que querem tentar a monografia geográfica da cidade que habitam ou conhecem, mas que ainda hesitam quanto ao método e à delimitação do assunto. Há às vezes qualquer coisa de árido e de penoso num inquérito aprofundado para um caso preciso, por ser este pouco interessante e pouco novo aos olhos daquele que o faz; não se deve esquecer que o futuro leitor está bem longe de saber tanto, sobre o tema, quanto o autor, impregnado pelo seu assunto; deve-se lembrar também que vamos repetindo afirmações fundadas mais sobre impressões do que sobre certezas científicas, e que o conhecimento dos fatos geográficos e sociais do vasto Brasil é ainda fragmentário. A grande ciência não se faz de um só golpe, mas elabora-se lentamente pela acumulação de dados elementares e há o maior interesse em multiplicar os estudos monográficos que terão tanto mais valor quanto menos se assentarem em conclusões definitivas. Muito provavelmente, certos leitores, em particular os que seriam tentados pelo estudo de uma grande cidade, julgarão que esta interpretação do que deve ser a monografia geográfica urbana invade amplamente os domínios históricos, econômicos ou sociológicos e, admitindo voluntariamente que a verdade é efetivamente complexa, procurarão justificar sua inação com a impossibilidade e o perigo de tudo abordar. Espero, contudo, ter assinalado suficientemente que não se trata de recolher fatos sociológicos e raciocinar sobre eles como sociólogo; também não sugiro que se proceda como historiador; repeti várias vezes que a parte de trabalhos que cabe ao geógrafo é a de dar uma interpretarão geográfica dos fatos históricos, sociológicos ou econômicos. Além disso, considerando justamente as dificuldades a vencer, parece-me que a melhor solução é constituir equipes de trabalho: se a realidade é complexa, por que nos obstinarmos a analisá-la em parcelas, apesar de tudo? Quase em toda parte a tendência é não mais submeter os fatos à dicotomia de nossos métodos tradicionais e escolásticos, mas, ao contrário, adaptar estes últimos às necessidades que a vida, completa, multiforme e em perpétuas transformações, nos impõem. O papel do geógrafo, na equipe de pesquisadores que empreendessem a monografia de uma grande cidade, poderia ser o de coordenador mas não o de ditador.
Um último aspecto da geografia urbana deve ser lembrado; esses estudos não são dos que, a pretexto de realismo e de espírito prático, devem ser considerados como inúteis e metafísicos (sem querer dizer que a metafísica seja inútil). Uma monografia geográfica é um relatório completo, com uma superioridade sobre os outros: esforça-se para dar uma idéia da vida tão exata quanto possível. Escrita com um espírito científico e com o desejo de compreender tendências que se elaboram surdamente no curso dos anos, no quadro dos dias, nas possibilidades do meio, a monografia geográfica pode prestar os maiores serviços práticos. Assim, tem-se freqüentemente falado da necessidade de estabelecer no interior do Estado de São Paulo unidades administrativas e econômicas. Não é de crer, então, que os que se voltam para esta questão encontrem uma base preciosa nas monografias dás cidades que determinem precisamente seu raio de ação? Não haveria também uma possibilidade de conhecer, por esses inquéritos, as necessidades e os desejos dos homens? Em muitos países, o valor prático ou imediato das pesquisas de geografia humana, valor que se prende à preocupação de síntese da ciência geográfica, foi já compreendido e utilizado. No Brasil, tanto nos corredores do Congresso de Geografia de Florianópolis, quanto na obra paciente e fecunda do Conselho Nacional de Geografia, podemos constatar que a mesma concepção se desenvolve: o estudo científico desinteressado, não é mais considerado como um luxo intelectual, e seu valor prático é avaliado de acordo com o espírito de pesquisa pura que animou o estudioso. Aí encontramos uma razão a mais para desejar que este guia da monografia geográfica urbana não seja inútil e que os próximos anos vejam crescer a bibliografia urbana brasileira.

Bibliografia

Para o Brasil deve-se citar antes de tudo:
PIERRB DEFFONTAINES: — The origin and yrowth of the Brazilian networks of towns —Geographical Review, 1938, vol. 28, p, 379-399. Este artigo dá indicações de algumas referências bibliográficas como P. E. James: Belo Horizonte and Ouro Preto, a comparative study of two brazilian cities. Paper Michigan Acad. of Sel. Arts and Letters, vol 18, 1932, Ann-Arbor 1933, pp. 239-258; e H. R. da Fonseca Filho: S. Tome das Letras — Rev. Soc. De Geogr. do Rio de Janeiro, vol. 35, 1932, pp. 46-58.
ARBOS (Ph.): — Petrópolis, esquisse de Géographie urbaine -- Revue de Geogr. Alpine. Grenoble XXV, 1938, pp. 477-530.
PRESTON E. JAMES: — Rio de Janeiro and São Paulo — Geographical Reviewt t. XXIII, 1933, pp. 271-298.
QUELLE (Otto) — Rio de Janeiro — Beitrag zur Geographie etner tropischen Grosstadt, Zeitschr. gesell fur Erdkunde zu Berlin, 1931, pp. 241-257.
AGACHE: — Cidade do Rio de Janeiro, extensão, remodelação e embelezamento — Paris, 1930.
DEFFONTAINES: — Rio de Janeiro, une grande victoire urbaine — Révue d'économie politique, 1937, pp. 92-109.
E. SIMÕES DE PAULA: — Contribuição monográfica para o estudo da segunda fundação de S. Paulo — 1936 — São Paulo.
CAIO PRADO JÚNIOR: — O fator geográfico na formação e no desenvolvimento da cidade de São Paulo — Geografia, n.3. ano I, pp, 239-262. O mesmo autor apresentou ao IX Congresso de Geografia um estudo completo sobre este assunto. Série de trabalhos executados pelos alunos da cadeira de Geografia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, apresentados ao IX Congresso Brasileiro de Geografia; estudos sobre Santo André (da autoria do Dr. Raul de Andrada), Casa Branca (pela prof. M. A. Paritoja), Jaboticabal (pelo prof. Odilon Nogueira Matos), Marllia (pelo prof. Pierre Monbeig), Franca (pela prof. M. C. Martins Ribeiro), Poços de Caldas (pela sra. B. de Carvalho Ramos), Catanduva (pela prof. Olga Pantaleão) e apresentação dos trabalhos (pelo prof. Pierre Monbeig).
Ver também a coleção da Revista do Arquivo Municipal. Existem numerosos artigos exclusivamente históricos e estudos inspirados por cuidados de urbanismo. Esta literatura constitui um excelente material para os estudos geográficos mas não nos parece dever figurar nesta breve bibliografia. A titulo de exemplo e para se familiarizar com o método deve-se ler bons estudos de geografia urbana; entre os que figuram nas bibliotecas públicas de São Paulo, pode-se reter:
BLANCHAR GRENOBLE DEMANGEON: Paris (pequeno livro dedicado ao grande público e aos professores primários),
GLERGET: Lê Caire (dois volumes) — LESPES: Algerie.
Annales de Géographie: H. de Martonne: Buenos Aires (1935, p. 281-304, cf. resenha em Geografia), Morazé: Dakar (1936, p. 607-631), Soullas: Villes marches et villes de indutrie do Haute Normandie (1936, p. 399-414). Fichelle; Bratislava, étude de ville (1937, p. 189-194), Albitreccia: Ajaccio, lê port et Ia ville (1938, p. 361-372), Bochet: Klaipeda — Memel (1938, p. 372-392). Dubuc, L'approvisionnement de Paris en lait (1938, p. 257-266).
Annales d'Histoire économique et sociale: Joudan: La ville étudiée dans sés quartiers; lês halles de Paris au Moyen Age (1935, p. 285-301).
Na Géographie Universelle de Vidal de Ia Blache e Gallois pode-se ler o capítulo sobre Londres (Demangeon) e Berlim (De Martonne).
Uma notícia sobre os trabalhos de geografia urbana nos Estados Unidos foi publicada no número de Julho de 1938 dos Annales de Géographie (p, 435-439). No Geographcal Review, serão encontrados: Charles M, Davis: The cities and towns of the high plains of Michigan (1938, p. 664-673), Alfred Wright: Ohio towns paterns (1937, p. 615-624), John E. Orchard: Shangai (1936,p. 1-31), John K. Wright: The diversity of New York City, Comments on the real property inventory of 1934 (1936,p. 620-639).

Apêndice

A publicação deste artigo na Revista do Arquivo Municipal data de 1941 e sua redação de 1940. A fim de não ficarmos muito atrasados face aos progressos da geografia urbana, era indispensável trazermos complementos ao texto primitivo. A refundi-lo, ou simplesmente entrecortá-lo de novos parágrafos, pareceu-nos preferível colocar em apêndice os acréscimos que o tempo tornou necessários. Talvez a comparação dos dois textos permita ao leitor divertir-se em descobrir um avanço no pensamento do autor.
I — Após a época em que foi redigido este estudo, a bibliografia em matéria de geografia urbana cresceu consideravelmente, tanto em obras gerais como em pesquisas especificamente brasileiras. A título de simples informação, cremos dever indicar ao leitor as publicações seguintes: Chabot: Lês Ville; Pierre Georges: La Ville; Griffith Taylor: Urban Geography (ainda que muito simplista e decepcionante quanto ao fundo, mas rica em ilustrações); Dickinson: City and Regionalism; do mesmo autor : Cities of Western Europe. Para os estudos brasileiros, uma síntese dos trabalhos existentes está sendo redigida pelo professor Aroldo de Azevedo; como não saberíamos conduzir-nos neste campo melhor que esse especialista da aglomeração urbana paulista, cremos preferível enviar o leitor a essa publicação.
II — Não se trata de estudar tão-somente o quadro natural, mas também a utilização do solo pelos homens, antes do desenvolvimento do organismo urbano. Efetivamente, o passado rural deixa muitas vezes braços vivos na paisagem urbana atual. O traçado das ruas, por exemplo, corresponde algumas vezes, aos limites de antigas propriedades agrícolas; a forma dos bairros é influenciada pela configuração das propriedades agrícolas que, num certo momento, foram urbanizadas. No caso de São Paulo, cujo crescimento fez-se pelo loteamento e anexação de chácaras, poderia ser interessante tentar pesquisas neste sentido.
III — O ideal seria constituir uma equipe de pesquisadores que pusessem em ação processos de inquérito diferentes e com pontos de vista distintos, mas aparentados. Esperamos também que, nas Faculdades brasileiras, livres ainda das pesadas tradições universitárias européias, e onde não deveriam existir rivalidades escolásticas entre pesquisadores, caiam as cortinas de ferro que isolam geógrafos, sociólogos, historiadores e economistas.
Todos caminham para um mesmo fim que é o de melhor conhecer e melhor compreender as sociedades humanas. Uma cidade é a expressão de uma civilização ou, melhor ainda, das civilizações que se sucederam em um determinado ponto do globo, deixando cada uma um traço positivo ou negativo mas que se encontra ainda na paisagem, ou na vida urbana. O conjunto de todas essas contribuições, o conjunto também de todos os fatores presentes constituem a cidade. É o mecanismo desses conjuntos , são as relações entre esses fatores que é necessário compreender.
IV — Torna-se necessário voltarmos a estes capítulos clássicos da geografia urbana: situação e sítio. Porque arriscamos muito quando, ao analisá-los, atribuímos aos homens de outrora ambições e idéias que são nossas e que eles não podiam ter. A situação de uma cidade não se explica pelo traçado atual das vias de comunicação nem pela cartografia atual das economias regionais; explica-se pelos antigos traçados das vias de comunicação, pelas cartografias passadas das economias regionais. As "vantagens" atuais da situação e do sítio eram talvez, outrora, inconvenientes; e reciprocamente. Eis porque é necessário ter cuidado para não emitir julgamentos em função das cartas contemporâneas, mas esforçar-se para projetar a geografia no passado. Assim, uma carta atual das estradas e vias férreas de São Paulo parece tornar sem razão a presença da capital paulista. Seria necessário para compreendê-lo, lembrarmos que, nos bons tempos do café, Campinas quase passou à frente de Piratininga, precisamente porque estava em melhor posição, relativamente aos meios de comunicação. Em realidade, sítio e situação só tomam seu valor próprio quando em relação com as necessidades e possibilidades dos homens. É isto que se quer exprimir quando se diz que o sítio e a situação são menos causas do que conseqüências. Portanto, o estudo geográfico de uma cidade não deve começar cegamente pela análise do sítio e da situação. O geógrafo tem todo interesse, se quer compreender e não somente descrever, em mergulhar resolutamente no passado dos homens que no curso dos séculos e das décadas, fizeram a cidade. É indispensável que conheça antes de qualquer outra coisa quem eram esses homens, como viviam, quais suas técnicas, suas necessidades, seus recursos, seus hábitos, seus pensamentos. O caminho Aparentemente mais fácil, o que vai da natureza aos homens, é também o mais enganador. Mais vale partir dos homens para a eles voltar em seguida e sempre.
Um bom exemplo de erro possível, desde que se pretenda tirar do quadro físico a justificação de uma cidade, é dado pelo caso das cidades dos planaltos ocidentais de São Paulo. Em todas elas, são mínimas as diferenças de situação e de sítio; estas diferenças são demasiado insignificantes para explicar que tal patrimônio tenha-se tornado uma aglomeração importante e prospera enquanto seu vizinho vegetava ou só se elevava a uma atividade modesta. Tentamos mostrar o quanto deviam estas desigualdades nos destinos urbanos, a muitos fatores econômicos, humanos e psicológicos (Pionniers et Planicurs de São Paulo, Paris, 1951).
V — O plano da cidade transforma-se continuamente. Não está amoldado ao quadro natural, como a massa de um bolo à fôrma da cozinheira. Isto seria muito fácil. Certamente, é muito freqüente que o aspecto geral de uma aglomeração, sua configuração de conjunto, resultem da topografia. Encontram-se aí, muitas vezes, evidências que merecem ser assinaladas e explicadas, mas elas não devem fazer com que se esqueçam os detalhes e as anomalias.
Mais ainda que a média honesta, a exceção e o caso particular merecem a atenção científica porque é aí muitas vezes que se escondem os verdadeiros problemas. A extensão da cidade é interessante não para ser simplesmente narrada, mas a fim de mostrar as modificações sucessivas do plano urbano (isto é, de um elemento fundamental da paisagem urbana). O difícil, mas também o mais importante, é traçar o processo evolutivo. Isto é,- retratar como e sob que impulso se modificam os fatores responsáveis pela paisagem urbana. Os fatores não são simplesmente locais ou regionais, e a faísca que de repente desequilibra o complexo urbano e excita seu crescimento (ou sua degenerescência) pode vir de muito longe. É raro que se possa encontrar no interior mesmo de um complexo geográfico urbano ou outro, as causas de sua evolução.
Será necessário ainda lembrar o perigo que se corre ao pretender explicar tudo pela ação de um só e único fator evolutivo?
Nas cidades onde o aumento da população é sensível, a primeira questão é fixar exatamente este aumento e medir-lhe o ritmo, Depois procura-se as razoes do fenômeno, Sabe-se que são variadas, Mas não se negligenciará a análise demográfica, isto é, o estudo da natalidade e da mortalidade ao mesmo tempo que o da repartição dos sexos e dos grupos de idades. Seria extremamente útil tentar precisar os caracteres do movimento de imigração urbana: um inquérito minucioso levará a indagar de onde vêm os novos habitantes, se se trata de seu lugar de nascimento ou de uma residência intermediária. Deve-se reunir também documentos sobre as profissões e suas modificações eventuais com a passagem à vida urbana. 
Reciprocamente, se se constata uma diminuição da população ou simplesmente um fraco aumento, a análise demográfica merece ser desenvolvida. E o pesquisador preocupar-se-á com as direções tomadas pelos habitantes que deixaram a cidade.
A realidade jamais é simples e temos de conhecer o conjunto das causas, sem esquecer as ações que exercem umas sobre as outras. Assim, examinar-se-á o mecanismo da inflação, da valorização dos bens imobiliários, da industrialização e das crises do café, para compreender, ao mesmo tempo, por que e como cresceu São Paulo desde há uns quinze anos.
VI — A diferenciação dos bairros que não aparece claramente nos primeiros tempos da existência urbana (a não ser nas cidades planificadas, por exemplo), se faz progressivamente. Sob que pressões, eis o que é preciso estudar, Acrescentar-se-á que, mesmo em uma cidade muito grande, e mesmo em uma cidade muito velha, as paisagens dos diferentes bairros transformam-se sem cessar. Sabemo-lo bem quando vemos os palacetes da avenida Higienópolis ou da avenida Paulista caírem sob os golpes dos demolidores para dar lugar a gigantescos imóveis de apartamento? Aí, a passagem dum estado para outro é brutal e se o quadro urbano muda, a função social dessas grandes artérias paulistas se modifica pouco.
Em Paris, André Siegfried divertiu-se em estudar o lento deslizar da alta sociedade do faubourg de Saint-Germain-des-Prés, e do faubourg de Saint-Honoré, para o XVI arrondissement: os membros das Academias, os administradores da "Companhia do Canal de Suez", os membros dos grandes clubes emigraram para o Oeste e para a margem direita do Sena. Pouco a pouco, os parisienses menos afortunados são de algum modo postos à margem e jogados nos bairros mais orientais e mais excêntricos. De certa maneira, a política dos loteamentos, da limpeza, da eletricidade ou da escola, contribui para dispersar as massas trabalhadoras antigamente muito mais concentradas. Daí resultam problemas de transporte diário entre uma residência longínqua e a fábrica ou o escritório; despesas, fadiga, desvantagens para a produtividade e sobrecargas para a coletividade, Decorre dai, também, uma dificuldade maior para os movimentos coletivos das massas.
A nova geografia urbana parisiense é bem menos favorável aos grandes agrupamentos operários que a do século XIX. Sem nada negligenciar de tudo o que distingue as duas capitais, pode-se perguntar se não se desenvolverão em São Paulo processos análogos. Parece que a separação entre os bairros de caracteres sociais diferentes é hoje mais forte do que antigamente. Quanto às distâncias a cobrir para ir da casa à fábrica, e à precariedade dos meios de circulação, o operário paulista conhece-os melhor que ninguém. Seria interessante incrementar os inquéritos relativos aos deslocamentos cotidianos para o trabalho no conjunto da aglomeração paulista: distâncias percorridas, tempo de percurso e também volume das faltas à fábrica ou ao escritório.
De grande interesse poderia ser ainda um escudo comparativo entre a geografia social no Rio e em São Paulo. A metrópole paulista nada possui que se assemelhe a Copacabana. Queremos dizer, nada que se assemelhe a esta justaposição e quase coexistência de duas classes sociais tão nitidamente separadas, como se pode ver em Copacabana. E destas geografias sociais tão diferentes não resultariam mentalidades igualmente diferentes?
VII — O estudo geográfico do habitai urbano merece um lugar maior do que o que lhe foi dado por mim em 1940. A casa da cidade é tanto um elemento da paisagem, como o é a casa rural. Nada o demonstra melhor que o avanço dos arranha-céus e dos prédios de apartamentos; fenômeno de explicação complexa e conseqüências múltiplas, Mas há também a casa dos bairros menos prósperos e a dos arrabaldes. Descrever esta casa é um ponto de partida; mostrar suas conseqüências e seus laços com outros fatos não é menos necessário. Pensamos nas relações entre tipos de casas e densidades urbanas. Seria também sugestivo cartografar as relações entre os fenômenos demográficos, a repartição das doenças, os tipos de comércio, as maneiras de pensar, o nível de cultura.
VIII — É numa espécie de geografia cultural que se poderia pensar aqui. Numa cidade muito grande, os habitantes dos diferentes bairros não lêem os mesmos jornais, não têm as mesmas opiniões políticas, nem as mesmas atitudes religiosas. Sociologia? Sem dúvida; mas se o sociólogo não se preocupa com isso, por que o geógrafo não se incumbiria da tarefa com ardor? Seu conhecimento da vida urbana é maior que o do sociólogo e ele poderá, assim, melhor situar as relações entre esta geografia cultural e a das casas, das densidades, das funções.
É evidente, porém, que neste domínio mais ainda que nos outros, é a colaboração do geógrafo e do sociólogo que é desejável.
Notemos ainda que um conhecimento das psicologias é preciso para que melhor se caracterize uma cidade em relação à outra. Será por acaso que os filmes intelectuais têm proporcionalmente mais êxito no Rio do que em São Paulo?
IX — Sobre esta outra questão, a função bancária, devemos retornar em um outro capítulo deste livro. Assinalemos, entretanto, o papel dos bancos no crescimento da cidade pelo credito que concedem aos construtores, aos loteadores, aos compradores de terrenos.
Não se poderá esquecer as conseqüências que a taxa de juro consentida pode ter sobre os preços dos terrenos, das casas, etc.
X — Não é um simples parágrafo que se deveria consagrar ao problema do raio de ação urbana. As influências de uma cidade se estendem mais ou menos longe mas não são sempre as mesmas, e suas manifestações são diversas. É indispensável tentar uma definição muito teórica do que é urbano e suburbano: o mais conveniente é trabalhar, inquerir e depois poder-se-á melhor definir. Parece, entretanto, que este artigo estaria muito incompleto se não disséssemos quão artificial e inacabado seria um estudo de cidade que esquecesse o subúrbio urbano. Tudo é aí verdadeiramente urbano? Não, já que se vêem aí, algumas vezes, campos e hortas entre as habitações de estilo urbano, habitadas por trabalhadores da cidade. Mas, estas culturas e seus cultivadores estão muito estreitamente ligados à vida urbana. A paisagem do subúrbio tem seus aspectos originais que são muito variáveis. Sua compreensão é impossível se os dissociamos da cidade vizinha. A vida não é aqui a da cidade, mas é entretanto inseparável da vida da cidade. Compreende-se que o papel do geógrafo seja o de descrever e explicar em quê o subúrbio ó urbano e em quê não o é ainda. Um dos pontos essenciais será pois estudar os meios de comunicação e as migrações de trabalho. Um outro será procurar os fatores que suscitam as anexações do campo pela cidade enquanto se tentará também reconhecer as direções que toma atualmente a expansão urbana.
A região urbana é já coisa diferente do subúrbio.
Santos talvez faça parte da região urbana paulista, mas não do seu subúrbio. As terras cultivadas de Jundiaí e de Itatiba devem sem dúvida ser inscritas na região paulista, mas as de Cotia merecem ser englobadas em seu subúrbio. Os cultivadores das primeiras não produzem somente para a Capital e nem para aí vão todos os dias pessoalmente vender seus produtos; coisa que fazem em grande número os cultivadores de Cotia (subúrbio de legumes e frutas, o que não é ò mesmo que subúrbio industrial). As migrações cotidianas de trabalho não afetam a maioria da população da região urbana; são mais uma prática da gente do subúrbio, onde homens e mulheres se deslocam todos os dias.
XI — O estudo geográfico de uma cidade coloca o problema das relações entre o campo e a aglomeração urbana. Essas relações são múltiplas e diversas; dependem da importância da cidade, da variedade de suas funções e dos tipos de organização econômica. Se se considera o caso brasileiro, é-se levado a desejar estudos mais precisos que permitam distinguir os tipos das relações cidade-campo muito diferentes segundo as regiões, e determinar como e com que velocidade evoluíram estas relações. No início do moderno crescimento de São Paulo, quando se intensificou a cultura do café, houve grandes mudanças nas relações entre a capital e as zonas rurais, modificações que contribuíram para a fixação de novos habitantes na cidade. Por outro lado, parece que se pode notar uma modificação recente nas relações entre as cidades do interior paulista e as regiões rurais que lhes são vizinhas.
A cidade, cada vez menos exclusivamente, é um centro comercial e administrativo onde não residem os agricultores, com exceção de alguns fazendeiros. Cada vez mais, um certo número de trabalhadores agrícolas, algumas vezes mesmo fazendeiros, moram na cidade e vão todos os dias de caminhão para as fazendas. Qual é a importância desta transformação? A que ponto é realmente fundada esta observação e até onde pode ser generalizada, eis o que se precisaria saber. Por outro lado, as relações cidade-campo não são as mesmas no Rio Grande do Sul, em São Paulo ou no Nordeste e vê-se que há aqui um grupo de problemas que esperam o geógrafo.
É relativamente fácil descrever o que a cidade extrai do campo; um assunto clássico das lamentações acadêmicas são o êxodo rural e suas conseqüências, Mais difícil, mas também útil, seria conhecer tudo o que a cidade dá ao campo, sem esquecer o que deveria dar-lhe, se um freio fosse colocado nessas relações hoje anárquicas, Atitude paradoxal é a dos que desejam a industrialização de uma região e tudo fazem para que esta industrialização se dê nas grandes aglomerações, onde é mais rentável, e entretanto gemem diante da partida dos camponeses para a cidade, diante das tristes conseqüências sobre a vida urbana, etc. Isto quer dizer que para compreender o fenômeno da emigração rural, não basta descrevê-lo, é preciso ainda analisar-lhe o processo. Em troca, esquecemos muitas vezes de pesquisar a evolução nos campos, sob a influência das cidades: transformação não só das culturas, como dos métodos de cultura, valorização das terras e dos imóveis, evolução dos tipos de propriedade, contribuição intelectual, elevação do nível de vida e melhoria da saúde; outros tantos proveitos devidos à influência urbana.
Haveria estudos a fazer sobre a evolução dos ordenados, dos níveis de vida, das situações demográficas nos campos diretamente atingidos pelas cidades; e estes estudos seriam complementares do inquérito de geografia urbana, que não pode ser estreitamente limitado às fronteiras municipais de uma cidade. A aglomeração urbana não vive apartada de toda raiz rural.
XII — Escrevendo estas páginas, pensamos trazer um pouco de ajuda aos jovens geógrafos desejosos de abordar o estudo urbano. Eis porque tudo, isto vale apenas como um guia técnico, com rubricas bem distintas, A prática exigirá muitas vezes, porém, que se modifique sem piedade a ordem seguida na enumeração dos problemas a abordar. Não há receita definitiva para um estudo geográfico.
O estudo de uma cidade não pode ser concebido como um móvel com gavetas cheias sempre do mesmo conteúdo e que é indispensável fornir igualmente, abrindo-a3 uma após outra numa ordem invariável. Isto seria ainda admissível para o inicio de uma pesquisa ou para jovens principiantes. É necessário, desde logo, estabelecer o que é verdadeiramente importante e o que o é menos; determinar onde reside realmente o interesse da aglomeração que se estuda. É desta forma que se deve orientar todo o esforço do pesquisador, mesmo que assim ele seja levado a negligenciar algumas das gavetas que lhe propusemos.
Uma monografia não tem valor se tudo é aí posto no mesmo plano; como um desenho não tem valor se as sombras e as luzes não se opõem rigorosamente. O bom desenhista situa o seu assunto e acentua os contrastes sem exagerá-los. O mesmo acontece com o bom geógrafo.
Cada cidade apresenta seus problemas próprios. Aqui será o crescimento rápido, aí, ao contrário, a estagnação, mais adiante, será a função ou, ainda, o sítio ou a expansão. São problemas que devemos primeiramente reconhecer, depois apresentar e, por fim, se possível, explicar. Vale dizer que, trabalhando sobre o real, é o real que temos o dever científico de estudar, fugindo de toda esclerose, abandonando qualquer estreita obediência ao método.


[1] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Conselho Nacional de Geografia, inquérito de alta cultura geográfica, contribuição cultural do IX Congresso Brasileiro de Geografia (1940), Florianópolis. Gilberto Freire: Geografia Urbana.
[2] Uma pequena bibliografia encontra-se no fim deste estudo.
[3] Stuart Alfred Queen e Lewis Francis Thomas: The city, a study of urbanism in the United States, 1939.
[4] Para este trecho, ver Vidal de Ia Blache: Príncipes de Géographie Humaine, obra póstuma e incompleta quanto à geografia urbana: o mestre da Geografia Humana publicou artigos sobre este tema nos números dos Annales de Géographie, os quais me parece inútil indicar ao leitor por não existirem nas bibliotecas públicas brasileiras. Ver ainda J. Brunhes, La Géographie humaine. Lavedan: Geographie dês villes (coleção dirigida por Deffontaines, publicada por Gallimard em Paris) e Lucien Febvre: La terre et l`evolution humaine.
[5] Park and Burgess: The city. Sem falar dos numerosos inquéritos sociológicos realizados em Chicago.
[6] Dion: "Vue générale de Ia région du Nord", em Introduction à l`aménagement d'une région, Urbanisme, revista mensal do urbanismo francês. Paris, VII, março-abril, 1938, pp, 73-144.
[7] Maria da Conceição Martins Ribeiro: França, contribuição ao estudo dos centros urbanos brasileiros, trabalho apresentado ao IX Congresso Brasileiro de Geografia. A autora cita Saint-Hílaire: Viagem a província de São Paulo, p. 117 da tradução de Rubens Borba de Morai, 1940.
[8] H. Baulig: New York. V, Cap. XIX, terceira parte (Estados Unidos) do tomo XIII (América Setentrional) da Géographie Universelle de Vidal de Ia Blache e Gallois, pp, 355-366. Paris, 1936.
[9] Ver a bibliografia geral, artigo da Geopraphical Review.
[10] Rubens Borba de Morais: Contribuição para a história do povoamento em São Paulo até fins do século XVIII, in Geografia n,° l, ano I, pp, 69-87, 1935. Este trabalho que, infelizmente, não foi completado pelo tutor, apresenta uma classificação do tipo de povoamento urbano paulista: habitante anônimo, aldeias .índias, sesmaria e fazenda, capela (de fundação particular, de fundação coletiva, de peregrinação) pouso (de bandeira e de tropa), fundação deliberada (militar e patrimônio). Para completar esta classificação depois do fim do século XVIII, o autor pensa que seria suficiente acrescentar; as estações de estrada de ferro e os patrimônios industriais. Todo estudo, geográfico ou histórico das cidades brasileiras deverá, daqui por diante, supor o conhecimento deste artigo.
[11] Maria Aparecida Pantoja: estudo funcional de um centro urbano: Casa Branca trabalho apresentado ao IX Congresso Brasileiro de Geografia. Para São Paulo, ver Batista Pereira: A Cidade de Anchieta, na Revista do Arquivo Municipal (1936, vol. XXIII, pp. 1-123).
[12] Trabalho já citado.
[13] Trabalho de Luigi Galvani: Algumas características demográficas de São Paulo. Boletim do Departamento Estadual de Estatística, São Paulo, n. l, ano 1939, pp. 17-58.
[14] O recenseamento de 1940, que foi executado nas cidades segundo o sistema dos bairros adotado pelo Departamento de Cultura de São Paulo, constituirá, sem dúvida, uma fonte preciosa para os estudos minuciosos ao mesmo tempo que sua variedade ajudará a estudar todos os aspectos da vida citadlna
[15] Ver trabalho já citado.
[16] Ver a coleção da Revista do Arquivo Municipal, Um modelo pode ser fornecido por Oscar Egidio de Araújo, Distribuição ecológica dos sírios no município da Capital do Estado de São Paulo, tese apresentada no IX Congresso de Geografia e publicada pelo Boletim do Departamento Estadual de Estatística, n.° 10, ano II, outubro de 1940, pp, 33-48.
[17] O crescimento febril de certas grandes cidades concretiza-se admiravelmente pela construção dos gráficos representando o ritmo das construções de Imóveis e de transações imobiliárias, Ver Nelson Mendes Caldeira: Aspectos da evolução urbana de São Paulo, Boletim do Departamento Estadual de Estatística, ano I, n.» 6, julho de 1939, pp. 23-54.
[18] Assim como a ponte “Hercílio Luz" em Florianópolis.
[19] O volume restrito da população urbana limita também as possibilidades das empresas de transportes coletivos. Existem, entretanto algumas de ônibus para os percursos maiores, mas a bicicleta continua o melo de circulação mais popular.
[20] O negócio dos ônibus. O observador econômico e financeiro, ano IV, n, 41, Junho 1939, pp, 77-94.
[21] Inútil lembrar tudo o que se pode tirar dos relatos dos antigos viajantes, Saint-Hilaire, D'Orbigny, Spix e Martius, Zaluar, etc. Os almanaques constituem uma outra fonte de informações, ao mesmo tempo pelos artigos e pelos anúncios.
[22] Monbeig (Pierre) e Guinard (Paul): Madrid, Annales de Géographie, 1932, t, XLI, pp. 481-490.
[23] Monbeig (Plerre): Un voyage de S. Paulo a Goiania, essai sur les zones d'influence paullste. Bulletin de l'Association des Géographes Français, n. 118, Janeiro 1939, pp, 10.
[24] Cf. artigo de Deffontaines da Geographical Review.
[25] Beatriz de Carvalho Ramos: Poços de Caldas, trabalho apresentado ao IX Congresso Brasileiro de Geografia, 1940.
[26] Phillippe Arbos: Petropolis, esquisse de géographie urbaine.
[27] Encontrar-se-ão entre as teses de geografia regional, tão numerosas na França, bons exemplos de estudo de cidade em função de uma região. Entre muitas outras, citemos a tese de Pierre Georges, La région Du Bas Rhóne, Paris, 1935, que possui capítulos muito instrutivos sobre Nimes, Orange e, sobretudo, Avinhão.

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* Extraido de MONBEIG, Pierre. O estudo geográfico das cidades.Boletim Geográfi co, IBGE. ano 1, nº 7, p. 7-29, outubro de 1943.
O texto aqui reproduzido não contém as figuras do original.